Auto da Barca do Inferno

...

Oh, que maré perfeita! Uma brisa que mata os valentes remadores do barco.

Diabo começa a cantar:

-Me venerem, me venerem!

Fidalgo -Ao inferno irei? É só o que me resta? Em minha vida não me preparei, e muito pequei.

Adorava ser adorado. Me perdi em meu status.

Irei, irei! Irei nesta barca de tristeza.

Diabo-Embarque logo, que aqui nos acertamos.

Pegue um par de remos, reme, e, chegando ao cais, eternamente me servirá.

Fidalgo- Espere, não posso ir ainda...aguardarei minha esposa, que agora sem mim, deve estar prestes a se matar por mim, coitada.

Diabo- Se matar por você? Hihihehaha.

Fidalgo- Disto tenho absoluta convicção.

Diabo- O seu chifre já cresceu, sua mulher você perdeu.

Hihihehehaha, grandes chifres!

Fidalgo-Como pode? Ela me escrevera palavras de amor.

Diabo-Lia muitas mentiras, e tu...foi enganado!

Fidalgo- Será que no fim de minha vida, nada de bom tenho eu?

Diabo- Foi sua escolha. Viveu como queria.

Hoje quando sua mulher rezou, agradeceu infinitas vezes pela sua morte.

Fidalgo- Mas, ela não chorou?

Diabo-Só se for de alegria. Hihihehahaha.

Fidalgo- Mas e suas lamúrias?

Diabo- Mentiras, mentiras! Neste momento ela pula de felicidade. Venha...entre logo.

Fidalgo-Sim...vamos, pois assim que deve ser.

Diabo-Senhor, entre e suspire, que mais gente já vem.

Fidalgo- Droga! Mas que barca quente! Maldito é quem nela embarca.

Diabo diz ao moço da cadeira:

-Saia daqui! Você estava na igreja, foi honesto, seu lugar é na outra barca. Aqui sofrerá horríveis dores...

Vem um Agiota e pergunta ao diabo:

Agiota- Ei, para onde vai a barca?

Diabo- Olha só! Se não é meu irmão, o grande Agiota. Por que demorou?

Agiota- Eu ainda queria demorar mais.

Zeus lançou-me uma maldição.

Diabo- Trouxe consigo o seu dinheiro? Hihihehaha.

Agiota-Apenas o que me deixaram trazer.

Diabo- Venha, entre aqui.

Agiota- De jeito nenhum.

Diabo- Hihihehaha. Esta com medo?

Agiota - Agora que faleci, deixe-me buscar outro barco!

Diabo- Meus pêsames Hihihehaha. Por que não embarcara aqui?

Agiota - Para onde e a viagem?

Diabo- Para onde você tem que ir.

Agiota -Vamos partir logo? E para onde e a passagem?

Diabo- Para a ilha infernal.

Agiota-Não! Não vou em tal catraia.

Agiota dirige-se a barca do paraíso

Ei da barca! Ira partir logo?

Anjo- Para onde acha que vai?

Agiota -Para o paraíso, mas é claro.

Anjo - Pois nem louco irei te levar para lá.

Embarque na outra; vai para quem te enganou!

Agiota -Porquê?

Anjo -Porque esse bolsão ocupara toda a catraia.

Agiota - Juro a Deus que vai vazio!

Anjo -Mesmo que o bolso vá vazio, seu coração ainda carregara o fruto de sua ganância...Carrega uma maldição consigo.

Agiota- Mas...por favor!

Anjo- Me desculpe, não posso embarca-lo aqui. Volte a outra barca.

Volta o Agiota à barca do Inferno e diz:

Agiota- Ei! Satanás!

Quero voltar ao mundo e trazer o meu dinheiro que aquele outro marinheiro,

porque me viu desprevenido, deu-me tanta porrada, que me matou.

Diabo- Entre aqui logo! E irá remar. Não percamos mais tempo.

Você servira a satanás, pois sempre te ajudei.

Agiota- Ahhhh, quem me cegou?

Diabo- Pare de se lamentar.

Entrando o Agiota na catraia, onde encontrou o Fidalgo, diz tirando o chapéu:

Agiota-Fidalgo, que prazer! Vossa senhoria veio para ca?

Fidalgo- O prazer é do demônio.

Agiota- Mas que educado, senhor. Hahaha.

O parvo aproxima-se a catraia infernal

Parvo- Olá!

Diabo- Quem e você?

Parvo- Sou eu, o parvo. Esta barca e para mim?

Diabo- De quem?

Parvo- Dum pobre tolo.

Diabo-Sim, mas e claro! Entre!

Parvo- Mas...han...voando?...andando?

Ahh..por que fui morrer