RECURSO EXTÇRAORDINÁRIO
Por: Ednelso245 • 17/6/2018 • 10.300 Palavras (42 Páginas) • 286 Visualizações
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lei tem caráter supletivo, conferindo direito de herança aos herdeiros vocacionados somente no caso de inexistir testamento. 6. Já o grau forte refere-se à parte indisponível da herança (a chamada legítima), que corresponde à metade dos bens da herança que a lei impõe seja transferida a determinadas pessoas da família (os herdeiros necessários), que só deixarão de recebê-la em casos excepcionais também previstos em lei. Sobre essa parcela, o sucedido não tem liberdade de decisão, pois se trata de norma cogente. Apenas se não houver herdeiros necessários, não 1 TJ-SP, Arguição de Inconstitucionalidade nº 0434423-72.2010.8.26.0000, j. em 14.09.2011, DJ 11.01.2012 2 TJ-RJ, Arguição de Inconstitucionalidade nº 0019097-98.2011.8.19.0000, j. em 06.08.2012, DJ 03.09.2012 3 STJ, Arguições de Inconstitucionalidade suscitadas nos Recursos Especiais nº 1.291.636, 1.318.249 e 1.135.354 4 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Direito sucessório brasileiro: ontem, hoje e amanhã. In: Revista Brasileira de Direito de Família, ano III, nº 12, jan.fev.mar./2002, p. 65. 4 haverá legítima, e, portanto, o sucedido poderá dispor integralmente de sua herança. Esse regime impositivo justifica-se justamente pela necessidade de assegurar aos familiares mais próximos do sucedido um patamar de recursos que permita que preservem, na medida do possível, o mesmo padrão existencial até então desfrutado. II.2. Família e casamento 7. O regime sucessório encontra-se, assim, vinculado ao conceito de família. Na história brasileira, em decorrência da forte influência religiosa, o conceito jurídico de família esteve fortemente associado ao casamento. Seu objetivo principal era a preservação do patrimônio e da paz doméstica, buscando-se evitar interferências de agentes externos nas relações intramatrimoniais e nas relações entre pais e filhos. Nesse sentido, todas as Constituições anteriores à de 1988 que trataram expressamente do tema dispunham que a família se constitui pelo casamento5 . Em sentido similar, no plano infraconstitucional, o CC/1916 dispunha que a família legítima era criada pelo casamento (art. 229). 8. Até pouco tempo atrás, o prestígio ao matrimônio tinha suporte em uma concepção da família como ente autônomo, e não como um ambiente de desenvolvimento dos indivíduos. A família era tutelada pelo Estado ainda que contra a vontade de seus integrantes, ou seja, independentemente dos custos individuais a serem suportados. Alguns exemplos ilustram bem essa concepção. Na redação original do CC/1916, a família era chefiada pelo marido (poder marital – art. 233), de modo que a mulher, embora dotada de plena capacidade jurídica enquanto solteira, tornava-se relativamente incapaz ao se casar (art. 6º, II, Parte Geral). A mulher passava então a depender de autorização de seu marido para a prática de diversos atos da vida civil, inclusive para trabalhar. Apenas com a edição da Lei nº 4.121/1962, a mulher casada deixou de ser incluída, junto com pródigos e silvícolas, na relação dos relativamente incapazes. 9. Além disso, na redação originária do CC/1916, o casamento era indissolúvel, de modo que mesmo que os cônjuges vivessem em plena infelicidade conjugal deveriam permanecer casados, em prol de um suposto bem maior para a sociedade. Ressalvava-se apenas a possibilidade de desquite, que, porém, impedia novo matrimônio. Foi somente com o advento da EC nº 09/1977, objeto de calorosos debates, que se passou a admitir a 5 Cf. Constituição de 1934 – art. 144, Constituição de 1937, art. 124, Constituição de 1946 – art. 163, e Constituição de 1967, art. 167 – posteriormente renumerado para art. 175 pela Emenda Constitucional nº 01/1969. 5 possibilidade de separação judicial e de divórcio. Outra ideia existente nessa época era a de “débito conjugal”, segundo a qual a mulher deveria estar sexualmente disponível para o marido, ainda que contra sua vontade. Com fundamento no modelo de família instituído pelo CC/1916, havia quem defendesse que a cópula forçada pelo marido não configurava crime de estupro por se tratar de exercício regular de um direito. II.3. Família e filiação 10. A mesma concepção que orientava as relações entre cônjuges aplicava-se às relações entre pais e filhos. O pai/marido, na condição de chefe de família, exercia o pátrio poder (art. 380, CC/1916). Como lembra Gustavo Tepedino6 , ao pai eram conferidos poderes que permitiam, por exemplo, a imposição de processo educacional extremamente autoritário, que se expressava, por vezes, em castigos corporais severos, contra os quais não era possível haver oposição sem que se contestasse o pátrio poder, e, de forma reflexa, a paz familiar. Apenas com o advento da CF/1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os filhos deixaram a condição de objetos para se tornarem sujeitos de seu processo educacional. 11. Era ainda pior a situação de boa parte dos filhos havidos fora do casamento. A despeito do critério biológico de paternidade, os filhos nascidos de relações adulterinas e incestuosas não poderiam ser reconhecidos por expressa disposição legal (art. 358, CC/1916). Desse modo, estavam condenados a viver sem registro civil que os identificasse de forma digna e condizente com a verdade dos fatos, assim como estavam impedidos de demonstrar parte essencial de sua individualidade – sua origem e história familiar – como se integrassem uma classe inferior de indivíduos. Pagavam o preço de uma conta que não era sua apenas para que o conceito rígido de família então vigente não sofresse abalos. 12. Não é preciso ir mais longe para se perceber que a tradicional concepção jurídica de família, baseada no casamento, tratava a entidade familiar como um fim a ser protegido (ainda que a um custo muito alto), e não como um meio para o desenvolvimento da personalidade e da dignidade de seus membros. Seus integrantes eram muitas vezes forçados a relegar projetos individuais de vida boa a um segundo plano, tudo em prol da manutenção de uma dada concepção sobre as relações familiares-matrimoniais e sobre o papel do Estado em sua proteção. 6 Esse e outros bons exemplos sobre os paradigmas familiares do período anterior à Constituição de 1988 podem ser encontrados em: Gustavo Tepedino. A disciplina civil-constitucional das relações familiares. In: Vicente Barreto (Org.). A nova família: problemas e perspectivas, 1997, pp. 52-56. 6 II.4. Os diferentes modelos de família 13. Durante a segunda metade do século XX, porém, operou-se uma lenta e gradual evolução nesta concepção na sociedade brasileira, com o reconhecimento de múltiplos modelos de família. Nesse período, parcela significativa da população já integrava, de fato, núcleos familiares que, embora não constituídos pelo casamento, eram caracterizados pelo
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