Essays.club - TCC, Modelos de monografias, Trabalhos de universidades, Ensaios, Bibliografias
Pesquisar

RECURSO EXTÇRAORDINÁRIO

Por:   •  17/6/2018  •  10.300 Palavras (42 Páginas)  •  292 Visualizações

Página 1 de 42

...

lei tem caráter supletivo, conferindo direito de herança aos herdeiros vocacionados somente no caso de inexistir testamento. 6. Já o grau forte refere-se à parte indisponível da herança (a chamada legítima), que corresponde à metade dos bens da herança que a lei impõe seja transferida a determinadas pessoas da família (os herdeiros necessários), que só deixarão de recebê-la em casos excepcionais também previstos em lei. Sobre essa parcela, o sucedido não tem liberdade de decisão, pois se trata de norma cogente. Apenas se não houver herdeiros necessários, não 1 TJ-SP, Arguição de Inconstitucionalidade nº 0434423-72.2010.8.26.0000, j. em 14.09.2011, DJ 11.01.2012 2 TJ-RJ, Arguição de Inconstitucionalidade nº 0019097-98.2011.8.19.0000, j. em 06.08.2012, DJ 03.09.2012 3 STJ, Arguições de Inconstitucionalidade suscitadas nos Recursos Especiais nº 1.291.636, 1.318.249 e 1.135.354 4 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Direito sucessório brasileiro: ontem, hoje e amanhã. In: Revista Brasileira de Direito de Família, ano III, nº 12, jan.fev.mar./2002, p. 65. 4 haverá legítima, e, portanto, o sucedido poderá dispor integralmente de sua herança. Esse regime impositivo justifica-se justamente pela necessidade de assegurar aos familiares mais próximos do sucedido um patamar de recursos que permita que preservem, na medida do possível, o mesmo padrão existencial até então desfrutado. II.2. Família e casamento 7. O regime sucessório encontra-se, assim, vinculado ao conceito de família. Na história brasileira, em decorrência da forte influência religiosa, o conceito jurídico de família esteve fortemente associado ao casamento. Seu objetivo principal era a preservação do patrimônio e da paz doméstica, buscando-se evitar interferências de agentes externos nas relações intramatrimoniais e nas relações entre pais e filhos. Nesse sentido, todas as Constituições anteriores à de 1988 que trataram expressamente do tema dispunham que a família se constitui pelo casamento5 . Em sentido similar, no plano infraconstitucional, o CC/1916 dispunha que a família legítima era criada pelo casamento (art. 229). 8. Até pouco tempo atrás, o prestígio ao matrimônio tinha suporte em uma concepção da família como ente autônomo, e não como um ambiente de desenvolvimento dos indivíduos. A família era tutelada pelo Estado ainda que contra a vontade de seus integrantes, ou seja, independentemente dos custos individuais a serem suportados. Alguns exemplos ilustram bem essa concepção. Na redação original do CC/1916, a família era chefiada pelo marido (poder marital – art. 233), de modo que a mulher, embora dotada de plena capacidade jurídica enquanto solteira, tornava-se relativamente incapaz ao se casar (art. 6º, II, Parte Geral). A mulher passava então a depender de autorização de seu marido para a prática de diversos atos da vida civil, inclusive para trabalhar. Apenas com a edição da Lei nº 4.121/1962, a mulher casada deixou de ser incluída, junto com pródigos e silvícolas, na relação dos relativamente incapazes. 9. Além disso, na redação originária do CC/1916, o casamento era indissolúvel, de modo que mesmo que os cônjuges vivessem em plena infelicidade conjugal deveriam permanecer casados, em prol de um suposto bem maior para a sociedade. Ressalvava-se apenas a possibilidade de desquite, que, porém, impedia novo matrimônio. Foi somente com o advento da EC nº 09/1977, objeto de calorosos debates, que se passou a admitir a 5 Cf. Constituição de 1934 – art. 144, Constituição de 1937, art. 124, Constituição de 1946 – art. 163, e Constituição de 1967, art. 167 – posteriormente renumerado para art. 175 pela Emenda Constitucional nº 01/1969. 5 possibilidade de separação judicial e de divórcio. Outra ideia existente nessa época era a de “débito conjugal”, segundo a qual a mulher deveria estar sexualmente disponível para o marido, ainda que contra sua vontade. Com fundamento no modelo de família instituído pelo CC/1916, havia quem defendesse que a cópula forçada pelo marido não configurava crime de estupro por se tratar de exercício regular de um direito. II.3. Família e filiação 10. A mesma concepção que orientava as relações entre cônjuges aplicava-se às relações entre pais e filhos. O pai/marido, na condição de chefe de família, exercia o pátrio poder (art. 380, CC/1916). Como lembra Gustavo Tepedino6 , ao pai eram conferidos poderes que permitiam, por exemplo, a imposição de processo educacional extremamente autoritário, que se expressava, por vezes, em castigos corporais severos, contra os quais não era possível haver oposição sem que se contestasse o pátrio poder, e, de forma reflexa, a paz familiar. Apenas com o advento da CF/1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os filhos deixaram a condição de objetos para se tornarem sujeitos de seu processo educacional. 11. Era ainda pior a situação de boa parte dos filhos havidos fora do casamento. A despeito do critério biológico de paternidade, os filhos nascidos de relações adulterinas e incestuosas não poderiam ser reconhecidos por expressa disposição legal (art. 358, CC/1916). Desse modo, estavam condenados a viver sem registro civil que os identificasse de forma digna e condizente com a verdade dos fatos, assim como estavam impedidos de demonstrar parte essencial de sua individualidade – sua origem e história familiar – como se integrassem uma classe inferior de indivíduos. Pagavam o preço de uma conta que não era sua apenas para que o conceito rígido de família então vigente não sofresse abalos. 12. Não é preciso ir mais longe para se perceber que a tradicional concepção jurídica de família, baseada no casamento, tratava a entidade familiar como um fim a ser protegido (ainda que a um custo muito alto), e não como um meio para o desenvolvimento da personalidade e da dignidade de seus membros. Seus integrantes eram muitas vezes forçados a relegar projetos individuais de vida boa a um segundo plano, tudo em prol da manutenção de uma dada concepção sobre as relações familiares-matrimoniais e sobre o papel do Estado em sua proteção. 6 Esse e outros bons exemplos sobre os paradigmas familiares do período anterior à Constituição de 1988 podem ser encontrados em: Gustavo Tepedino. A disciplina civil-constitucional das relações familiares. In: Vicente Barreto (Org.). A nova família: problemas e perspectivas, 1997, pp. 52-56. 6 II.4. Os diferentes modelos de família 13. Durante a segunda metade do século XX, porém, operou-se uma lenta e gradual evolução nesta concepção na sociedade brasileira, com o reconhecimento de múltiplos modelos de família. Nesse período, parcela significativa da população já integrava, de fato, núcleos familiares que, embora não constituídos pelo casamento, eram caracterizados pelo

...

Baixar como  txt (67.6 Kb)   pdf (120.2 Kb)   docx (32.3 Kb)  
Continuar por mais 41 páginas »
Disponível apenas no Essays.club