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A Irmandade que representava os negros em Desterro/Florianópolis

Por:   •  6/8/2018  •  2.017 Palavras (9 Páginas)  •  242 Visualizações

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Fundação, construção e arrecadação da Irmandade

No ano de 1745, devotos de Nossa Senhora do Rosário dos Pardos e Pretos da Freguesia de Nossa Senhora do Desterro da Ilha de Santa Catarina, manifestam a sua vontade de criar uma irmandade em honra a Senhora do Rosário. Sendo assim, pode-se supor que a Irmandade já funcionava muito antes da confirmação de seu primeiro compromisso em 1750, pois era comum as pessoas se reunirem nas casas para rezar para seu santos de devoção até que conseguissem uma capela que os aceitassem, e somente mais tarde iniciavam um processo de legalização. Elaboraram e apresentaram um compromisso para que pudesse ser aprovado pelas autoridades eclesiásticas de Desterro. Para que a irmandade pudesse ser oficializada, era necessários a aprovação do compromisso, as normas de funcionamento, seus objetivos, os direitos e deveres de cada membro, e os papeis estipulados para os padres e demais indivíduos.

A construção da igreja foi possível devido à dedicação de muitos cativos que planejaram e executavam as obras da capela nos dias permitidos por seus senhores e senhoras, como sendo católicos, permitiam estas realizações por parte dos seus cativos como forma de “agradar” aos olhos da própria igreja.

A capela estava erguida nos anos de 1750, mas sem os aparatos almejados pelos membros da irmandade. Está é uma inquietação de seus membros que, desejavam a construção de uma igreja que pudesse abriga-los em melhores condições, pois sempre havia algo para ser melhorado ou modificado. O cuidado que os membros tinham com a igreja fazia com que os gastos da irmandade girassem em torno dos reparos da capela. Os aluguéis, os anuais, os valores recebidos em testamentos, esmolas e os rituais funerários, as formas de arrecadação utilizadas para esses fins principalmente.

Na irmandade os homens dirigiam e coordenavam as atuações e as atividades da irmandade. Já as mulheres estavam presentes nas ordens de compromisso, atuavam rainhas, juízas, escrivãs, irmãs de mesa ou mordoma (responsável pela organização das festas). As mulheres não tinham direito a voto, mas como rainhas, tinham grande destaque dentro das confrarias. Muitas cuidavam dos aparatos da igreja, das crianças e das atividades cotidianas.

A cada reforma, festa ou acontecimento importante era convocado uma reunião, discutindo sobre a festa da padroeira Nossa Senhora do Rosário e as despesas a serem tratadas. Sendo primordial a importância do esmoleiro, que garantisse a arrecadação dos recursos para as festividades. Mesmo a irmandade tendo outras fontes de renda, era através do esmoleiro que a maior parte da arrecadação se destacava. Houve um período que foi proibido esmolar no século XIX, e a irmandade foi impedida de cumprir com esta finalidade, assim, toda a instituição sentiu financeiramente os problemas. Mas depois de um ofício enviado ao Bispo Diocesano pelos membros da Irmandade, foi retomado as atividades de esmolar.

Outra fonte de recursos era o aluguel do caixão fúnebre. Pelo código de posturas de 1842, não era permitido mais sepultar sem um caixão fechado, o aluguel de caixões foi uma forma de cumprir o que foi estabelecido por lei, e ao mesmo tempo servir de arrecadação para a irmandade.

Festas, procissões e o enterramento

Ao chegar no momento das festas e das comemorações aos santos padroeiros, a irmandade se envolvia anualmente nas atividades festivas em torno das devoções a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos. Os preparativos envolviam muitas pessoas: como músicos, contratação de padre para as missas e sermões, compra de foguetes, além de todas as miudezas.

Estando todos os preparativos montados, a missa era celebrada pelo padre contratado pela irmandade. Em seguida á missa era o momento da procissão que levava a imagem do santo pelas ruas da cidade sobre uma padiola carregada pelos irmãos, enquanto os outros seguiam com as tochas. Durante a procissão acontecia o foguetório, à porta, da igreja está a bandeira da Irmandade, erguida com fogos e mais alegria, e em seguida acontece a coroação.

De acordo com Ana Maria Bidegain, o significado das festas para as irmandades leigas de pretos e pardos, pode ser identificado como lugar central nas atividades durante o ano.

“Tudo convergia para que a festa tivesse o máximo de esplendor”. Para a autora, a festa tem relação com o quotidiano e “é a única coisa diferente da vida diária; é um espaço de liberdade próprio de uma vida de escra –

vidão. O escravo deve trabalhar para o senhor, mas na festa dança pra si

mesmo”.[1]

A importância que a festa tinha para a vida de seus irmãos e irmãs em homenagem a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito era tanta que, nas ruas, as pessoas assistiam aos desfiles organizados pela irmandade com coroação de rei e rainha em homenagem aos padroeiros. A procissão era um momento crucial, e os cortejos ao rei e rainha tornavam as ruas da cidade numa paisagem diferente. A coroação de rei e rainha na Irmandade do Rosário de Florianópolis ocorreu até o ano de 1842 quando, a partir de um novo Compromisso, a Irmandade deixou de ter estes cargos, após os desentendimentos envolvendo crioulos, pardos e pretos. Outra cerimônia realizada pela irmandade era a do enterramento. Considerando que no Brasil nem sempre os corpos dos cativos ou mesmo dos pobres indigentes achados nas ruas recebiam enterro, e jogados em terrenos baldios, muitas vezes era atribuído ao descaso dos seus senhores. Sendo assim, a irmandade era o caminho para que se pudesse ter um enterro digno. Antes do compromisso do Código de Posturas de 1842, era costume enterrar os mortos nas igrejas, capelas e lugares santos, pela proximidade que esses lugares possuíam com a salvação. Assim, quanto mais próximo ao altar, mas chances de garantir a salvação da alma. A Irmandade do Rosário enterrou muitos de seus membros no interior da capela até o Código de Posturas. Com a criação do cemitério localizado onde é hoje a cabeceira da ponte Hercílio Luz, e com autorização da câmara municipal para que os membros da irmandade pudessem então enterrar seus irmãos e irmãs, a partir dessa mudança das melhorias higiênicas, para muitos da irmandade era uma nova preocupação. Pois além da questão financeira, o impacto emocional e religioso na vida dessas pessoas humildes, em grande número de origem africana, e que depositava muitas de suas crenças na boa morte, essa nova maneira de enterrar os mortos fazia com que um lugar próximo ao altar não existiria

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