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O ETHOS LIBERTÁRIO NA EDUCAÇÃO: O ESTUDO DA CONSTRUÇÃO DE UMA EXPERIÊNCIA DE EDUCAÇÃO LIVRE NO ENSINO PÚBLICO

Por:   •  15/7/2018  •  6.256 Palavras (26 Páginas)  •  285 Visualizações

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Na esteira dessas problematizações contemporâneas de autores (as) que resgatam a perspectiva libertária ou que se aproximam de seus pressupostos, que se buscará identificar e analisar quais as condições que dificultam a possibilidade de efetivar, no âmbito da educação pública, a construção de uma aprendizagem que contenha um ethos libertário no seu processo.

Entretanto, para responder a referida questão, a pesquisa empírica se dará em uma Escola de tempo integral chamada Professor Valdir Castro, da rede pública de ensino, no município de Rio Grande/RS que, há três anos vem construindo um projeto pedagógico baseado em referenciais teóricos da educação livre e libertária cujo modelo paradigmático é a Escola da Ponte (PACHECO, 1951), conhecida por ser uma das sete escolas públicas da pequena Vila das Aves, todas ligadas ao Ministério da Educação de Portugal, que tem se destacado pela persistência e singularidade no modo como se organiza e tece seu projeto educativo, voltado para a vivência da cidadania desde a escola (SANTA ROSA, 2008).

Edificada no ano de 1932, e constituída como projeto inovador em 1976 após ficar sob direção de José Pacheco, a Escola é da “Ponte”, pois uma ponte liga dois pontos, aproxima, promove a comunicação e o contato. A escola se faz ponte para a democratização do conhecimento, para a formação integral, para a cidadania. Ou seja, a hipótese de uma ponte promotora da passagem para a emancipação se fortalece quando refletimos que o início do seu projeto se dá em meio à abertura do regime político ditatorial, que imperou Portugal, do ano de 1926- 1974 (SANTA ROSA, 2008). A referida escola funciona normalmente, o que diferencia ela das demais é que ela acabou com a divisão de salas, os alunos trabalham por projeto e os professores atendem os projetos de forma interdisciplinar com a participação dos (as) alunos (as), que decidem as questões que cercam o ambiente escolar em assembleias, com a participação dos pais.

A escola da ponte, para manter sua sobrevivência, organizou um Estatuto, que é um instrumento para que o Estado não interferisse nas propostas na escola e permitisse a liberdade de experimentar essas mudanças. O Estatuto sempre tinha que ser assinado a cada ano renovando esse direito de manter certa “autonomia”.

Como observa Reimer (1979), presume-se que o papel da escola é educar, esta é a sua ideologia, o seu propósito público, entretanto, as escolas atravessaram os tempos sem serem contestadas e, se as escolas continuarem sendo, ainda por mais gerações, o principal meio de seleção social, o resultado será uma meritocracia, na qual o mérito se definirá pelo processo de seleção que ocorre nas escolas[5].

- JUSTIFICATIVA

Todo o grupo humano, ou sociedade cria seus mecanismos de transmissão e reprodução de sua cultura[6] para as gerações futuras, o que veio a se chamar Educação. Desde os gregos com a Paideia (formação do homem grego), passando pela escolástica medieval até a educação moderna, estatal e obrigatória, os indivíduos vêm criando e inventando formas de uma “melhor educação” que cumpra esse objetivo. Por isso, em cada tempo histórico dominado por tipos diferentes de cultura se constituirá um modelo específico de educação que se tornará predominante. Isto porque para reproduzir a cultura é necessário reproduzir um modelo de indivíduo e a educação é o instrumento mais potente para isso.

Toda sociedade necessita de um tipo de indivíduo a ser “cultivado”, formatado. Se os gregos com a Paideia queriam formar o homem livre, o excelente (aristói) e a escolástica a formação do sacerdote e condutor do rebanho dos tementes a Deus, na modernidade é necessário formar outro tipo de indivíduo, o 'sujeito', cujo termo se origina de assujeitamento. Ou seja, ao novo padrão de homem exigido pela sociedade baseada na divisão social e hierárquica do trabalho, um ser humano disciplinado, obediente e cumpridor de ordens. Nesse sentido, que Durkheim definirá bem o caráter dessa educação moderna cuja função fundamental será a de reprodutora da cultura dominante, a cultura da hierarquia e da dominação de uns sobre os outros.

Como dispositivo de governamentalidade[7], como diria Foucault, a educação cumpre um papel fundamental para o Estado, tornando-se um dos mecanismos mais eficazes de controle social[8], como expõe Reimer (1979):

A educação escolar é uma forma quase perfeita de imposto regressivo, pago pelos pobres para beneficiar os ricos. Escolas são sustentadas, principalmente, por tributos gerais que, no final, recaem mais sobre as classes menos favorecidas do que sua incidência direta poderia sugerir.

Esse modelo de educação estatal, obrigatório desde sua consolidação como paradigma para o mundo ocidental a partir da segunda metade do século XIX na Prússia, não esteve isento de muitas críticas, de pensadores e filósofos. Para além da crítica, serão os educadores anarquistas pela primeira vez que realizaram experiências educacionais que romperam com a lógica de educação estatal e a chamaram de Educação Libertária[9]. São experiências emblemáticas as Escolas Camponesas de Iasnaia Poliana de Tolstói na Russia (1890); O Orfanato de Cempuis de Paul Robin na França (1890-1904); a Escola Moderna de Francesc Ferrer i Guàrdia. (1889-1909) na Catalunha, e a Colmeia de Sebastien Faure, sendo essa a experiência que mais se aproximou dos princípios do anarquismo, como a autogestão econômica, política e pedagógica[10].

Cabe destacar que a educação ao modelo Francisco Ferrer (Escola Moderna) tornou-se paradigma da Educação anarquista em todo o mundo na primeira metade do Século XX. No Brasil, durante duas décadas (1910-1920) foram criadas pelos operários anarquistas (que hegemonizaram o movimento operário brasileiro nesse período) as Escolas Modernas em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, e Porto Alegre. Essa experiência foi pioneira da Educação Popular no Brasil, pois era a primeira experiência de educação feita por trabalhadores para os próprios trabalhadores. Com o advento da Revolução de 30 e o controle dos sindicatos pelo Estado, os anarquistas perdem a hegemonia e encerram-se suas experiências educacionais autônomas.

Passados mais de 100 anos dessas experiências, a perspectiva da Educação Libertária ressurge como possibilidade alternativa no contexto de crise do modelo prussiano ainda vigente no nosso século. Na contemporaneidade, pensadores como P. Bourdieu, Ivan Illich, Foucault, Paul Godman, Maurício Tragtemberg, Alexandre Neill, José Pacheco, recolocam a questão do significado desse modelo de

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