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Resenha As ideias Fora do Lugar e o Lugar Fora das Ideias

Por:   •  3/5/2018  •  4.534 Palavras (19 Páginas)  •  648 Visualizações

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Na intenção de promover uma sociedade justa e moderna, usando as ferramentas do planejamento urbano, fizeram o FNRU². Entregaram uma sociedade desigual no atraso com as mesmas ferramentas, e a proposta de certa forma falhou, de alguma maneira deu certo. Citando Villaça fica exposto o porquê: Existe uma certa distância entre a funcionalidade e a proposta moderna de plano urbano bibliográfica e as práticas, sejam elas nos edifícios ou cidades. Grande parte desta diferença se dá pela estrutura de poder brasileira e seus projetos. Descontínuos, sazonais e quase sempre imediatista, logo desquitam-se do projeto intelectual de redimir o subdesenvolvimento brasileiro.

Ainda no contexto do Fórum Nacional, prezou-se e legalidade à legitimidade, como se o problema social morasse no legislação e no controle do mercado (se uma parcela da população é ilegal, justamente por ser financeiramente vulnerável, não faz sentido falar de um ou de outro).

¹ Instituto de Arquitetos do Brasil

² Forum Nacional de Reforma Urbana

Então surge uma forma recorrente, como que pano de fundo para essas considerações, e até enfadonha pela frequência (ao menos para este que escreve) por aparecer em toda literatura sobre arquitetura brasileira: Brasília. Talvez por que esta reúne toda a audácia, todas as justificativas, e todas as debilidades da época de sua idealização. Foi objeto de desejo, de um momento (raro como eufemismo para único) em que o planejamento urbano encontrou sinergia com a política.

Por isso é tão notável em âmbito nacional. Mesmo com Louis Cruls nada havia antes, Corbusier fornece a ideia, Juscelino o lugar. Então Brasília é a ideia e o lugar, um novo corcovado com outro sinal de redenção, ao menos até a queda de Jango tolher-lhe a primeira. Para a óptica internacional trata-se de um plano levado a cabo na íntegra, com todo esforço despendido de maneira planejada e coordenada. Por demandar tanta concentração acabou por relegar o leito onde deitara. As até então chamadas cidades-satélite e as do entorno (mesmo sob a jurisdição do estado de Goiás) pintam o cenário da desigualdade e precariedade.

O plano falha aí - foi dado o passo maior que a perna, esqueceu-se deliberadamente das mazelas de país pobre. O contraste entre o Plano Piloto com seu SMPW e Águas Claras ou Riacho Fundo são inegáveis. A combinação destas pontuações e ressalvas terminam por demonstrar como deve ser robusto um plano

propaganda governamental e de aplicação responsável de conceitos que envolvam toda a sociedade de forma integrada e minimamente digna.

Após uma exegese moderada ficam mais claras as relações entre ideia e lugar propostas no título. Não tratam-se exatamente de um lugar para construir ou

uma ideia para empreender. Percorrendo a quase cronologia, depois de 4 capítulos surge o nono: 'A representação da cidade: construção da ficção', em que

se cessa tudo o urbanismo modernista canta, que plano econômico mais interessante se alevanta. Os Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado que uma vez colocados em prática, se mostraram na realidade brasileira em três falácias, não eram planos, não eram diretores e não promoviam integração.

Trazendo a tona o conceito escassez ou excesso por crescimento desequilibrado e a situação fica recursiva. O centro urbano recebe todo o aporte econômico e atenção não necessariamente urbanista, mas política enquanto a periferia fica deslocada da tal ideia. Não há direção para o crescimento, a cidade cresce e perde densidade, por consequência o valor da terra urbana crescem geometricamente na direção do marco zero, e os habitantes passam a se refugiar (junto com seus recursos) na coroa periférica. A busca pelo subúrbio demanda atenção pública, que quando exercida acaba por deslocar o centro e reiniciando o ciclo. Esse cenário, apesar de ser um horizonte de eventos fértil na visão financeira, exige um esforço deveras grande do poder público. Os tais planos têm de ser vendidos na vitrine da região rica da cidade, e viver numa democracia burocrática sob um governo de coalizão não ajuda. Devassidão orçamentária há de acontecer nesse cenário e o funesto populista aparece com uma missão dissimulada, e toma o eleitor como consumidor. Os custos em manter um cidade populosa e pouco densa são astronômicos, e arrasta também o custo de vida. Esses elementos são pedras fundamentais das favelas, que na dinâmica urbana acaba por gerar um impasse. A cidade é voraz na questão territorial e empurra quem não participa do mercado imobiliário, o que torna qualquer ocupação ilegal força e fraqueza pois, por ser ilegal não está amparada dos especuladores mas também não é sujeita a nenhum mecanismo coercitivo legal (pelo menos não em tempo judicial aceitável) para a retomada de tais localidades. O dínamo do concreto e asfalto encontra uma barreira e acaba por abraçá-la. Nessa situação o estilo empreendedor se protege - nascem os muros de contenção que isolam as favelas como quem isola leprosos; Põe em prática medidas dissuasoras do uso do espaço - estranhos incêndios e acidentes acontecem, sempre com causas obscuras, montanhas de entulho surgem da noite para o dia (vale ressaltar que essas atitudes não são clandestinas, afinal os alvos legalmente sequer existem. Isso fornece um salvo-conduto aos atores, e até esse ponto não interessa ao governo impedir).

Após toda empreitada para a posse da área surge o tão requisitado outrora: o Estado com a panacéia dos conjuntos habitacionais verticais, que podem servir como zona de amortecimento, além de liberar mais espaço proporcional. O exemplo clássico dado não poderia ser outro: São Paulo, onde há a combinação da desmobilização pública em torno das questões fora do interesse dos grandes capitais, a desmoralização dos trilhos e a propaganda da cidade ideal, que transforma-se na Cidade Oficial, para onde todos os esforços são direcionados, cabendo aos governantes e legisladores apenas não atrapalhar a marcha do 'progresso' e vendê-lo aos habitantes da outra cidade, a cidade esquecida. Basta olhar o imenso abismo que separa com poucos metros o Morumbi de Paraisópolis.

Este é um lugar sem ideias, não ideias propriamente mas ideais. Não chegou ao menos vislumbrar a diferença como na capital federal. A infeliz brasilidade reside numa mescla pesarosa voracidade desenvolvimentista, um estado volúvel e uma cultura de salve-se se puder, salvando quem puder. Provamos que temos capacidade da riqueza, mas vivemos como pobres, que detém o lugar, detém a

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