VIOLÊNCIA SIMBÓLICA CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E REFLEXOS NA SOCIEDADE
Por: Salezio.Francisco • 23/11/2017 • 2.071 Palavras (9 Páginas) • 387 Visualizações
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Neste sentido, a violência simbólica, despercebida na vida rotineira, encontra-se presente nos hábitos, nos costumes, nas leis, na mídia, nas escolas, nas universidades. Presente também nas pichações de muros, nos bancos quebrados de praças públicas, na sujeira das ruas, na poluição dos automóveis, na poluição sonora, na poluição visual dos incontáveis cartazes de propaganda, a violência simbólica é reforçada na rigidez e na dureza das paisagens urbanas.
No que tange à concordância entre o dominado e o dominador, este aspecto da argumentação de Bourdieu é muito pouco entendido, pois alguns entendem como se houvesse um acordo formalmente estabelecido no qual a dominação é reconhecida como legítima, quando na verdade esta se dá pela ação das forças sociais e pela estrutura das normas internas do mundo social em que os indivíduos se inserem, e que de certa maneira se incorporam em seus hábitos.
O sistema simbólico de uma determinada cultura é uma construção social e sua manutenção é fundamental para a perpetuação de uma determinada sociedade, através da interiorização da cultura por todos os membros da mesma. A violência simbólica se expressa na imposição "legítima" e dissimulada, com a interiorização da cultura dominante, reproduzindo as relações do mundo do trabalho. O dominado não se opõe ao seu opressor, já que não se percebe como vítima deste processo: ao contrário, o oprimido considera a situação natural e inevitável.
A violência simbólica pode ser exercida por diferentes instituições da sociedade: o Estado, a mídia, a escola, etc. O Estado age desta maneira, por exemplo, ao propor leis que naturalizam a disparidade educacional entre brancos e negros, como a Lei de Cotas para Negros nas Universidades Públicas. A mídia, ao impor a indústria cultural como cultura, massificando a cultura popular por um lado e restringindo cada vez mais o acesso a uma cultura, por assim dizer, "elitizada".
Ao focalizarmos "grupos menores", constataremos que o problema da violência simbólica é ainda mais gritante. Uma criança da periferia, por exemplo, tem um cotidiano muito distante do que é ensinado na escola. Na escola ela aprende que é importante estudar para ter uma profissão, para "ser alguém na vida". No entanto, muitas vezes esta criança trabalha para ajudar a família e, dependendo do caso, viver para ela é uma questão de sobreviver. Outro exemplo está na realidade das crianças que residem nas favelas dos grandes centros urbanos, onde é comum a família viver salvaguardada por traficantes: o mocinho que protege sua família torna-se o bandido, que na escola é tratado como o maior dilacerador da instituição família.
Estes são casos em que o conflito de realidade é observado facilmente.
Uma crítica a esse conceito parte do pensamento do filósofo alemão Jürgen Habermas e diz respeito à violência equivaler sempre a agressão física, portanto exterior ao simbólico. Contudo, essa crítica, além de restringir a violência apenas à dimensão física, ignora a possibilidade de as crenças dominantes imporem valores, hábitos e comportamentos sem recorrer necessariamente à agressão física, criando situações onde o indivíduo que sofre a violência simbólica sinta-se inferiorizado como acontece, por exemplo, nas questões de bullying, raça e gênero.
"Todo o poder que exerce violência simbólica, isto é, todo o poder que consegue impor significações e impô-las como legítimas, dissimulando as relações de poder que estão na base da sua força, junta a sua própria força simbólica específica a essas relações de poder. Podemos portanto afirmar que: o poder da violência simbólica consiste em impor significados; baseia-se nas relações de poder (a distribuição desigual do poder resultante da sociedade de classes); estas relações de poder são dissimuladas por processos de legitimação; e escondendo as relações de poder, a violência simbólica estabelece-se e aumenta a sua própria força." (JOHNSON, Allan).
3 FILME CURTA METRAGEM “VISTA A MINHA PELE” E A VIOLÊNCIA SIMBÓLICA
O filme “Vista a Minha Pele” do diretor Joel Zito Araújo apresenta uma inversão de papéis entre negros e brancos na nossa sociedade. Em sua versão, o mundo foi explorado e colonizado pelos negros do continente mais rico, a África, sendo a Europa um continente pobre. Nesse Brasil fictício, os brancos são o povo oprimido e que sofre com o preconceito e a pobreza, enquanto os negros são a classe dominante.
A protagonista do filme é uma menina branca passando por tudo o que passa uma menina negra, tentando vencer o preconceito, queixando-se, argumentando com o sua melhor amiga negra e com o público sobre suas dúvidas e medos. Do outro lado, Sueli, negra a favorita da escola, os meninos negros e de boa família queriam ser amigo dela ou seu namorado. Maria a admirava, e a imitava em quase tudo, e admirava mais ainda a cor da sua pele.
O filme “Vista minha Pele” trata do preconceito que muitos jovens passam na adolescência de um jeito criativo e demonstra muito bem a questão da violência simbólica demonstrando como esta age de modo dissimulado e imperceptível ao "senso comum".
Maria, uma menina de pele clara, cabelos loiros, olhos azuis é nada mais do que uma garota comum que tem sonhos, que estuda e tem sua família, que vive para encontrar o seu futuro em uma sociedade racista, preconceituosa e hipócrita, que vira as costas para o problema aparente. As questões raciais que são relatadas nos permitem pensar sobre nossa própria realidade, nossa vida e como tratamos os outros sem pensarmos apenas em nós mesmos. Maria é uma excluída, pois mesmo tentando ser uma garota normal, fazer parte de um grupo, ela não é aceita pelo restante, por causa da sua pele, por causa do seu jeito de ser, que entre outras coisas a fazem ser uma estranha aos olhos da maioria. Provocações diversas e violência simbólica presentes a todo momento.
É discutido também o conceito de Estigmatização, situação que ocorre quando um grupo rotula outro com base na sua posição de poder. Um grupo pode ser estigmatizado com base na cor da pele, condição financeira, origem, entre outros. Com isso a discussão sobre raça está além da cor e se constitui em uma questão de valores e de ideologias.
O filme mostra que a discriminação racial e o sofrimento de um povo que convive diariamente com o preconceito pode ser superada travando-se as batalhas corretas, buscando que sejam atingidos seus objetivos sem medo.
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