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Questões de Gênero e Liberdade Religiosa

Por:   •  13/9/2018  •  5.244 Palavras (21 Páginas)  •  284 Visualizações

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Para Abramowitz (2003), a história da criança sempre foi constituída sobre a criança e não para a criança. Uma vez que a criança, sobre essa visão é destituída de razão é válido frisar que a palavra infância vem do latim infans que significa aquele incapaz de falar. Além disso, segundo Barbosa (2007), a socialização deveria ser emanada da geração mais velha para a mais nova. No entanto, esse fenômeno se alterou nas sociedades ocidentais contemporâneas passando a se estabelecer de modo não apenas vertical, mas agregando vivências em ambientes diversos como família, amigos, creche, veículos de mídia, etc.

Ohouan ainda cita Corsaro (2002, 2011) ao falar do trabalho exercido por ele no campo da reprodução interpretativa. Tal reprodução não se dá de maneira passiva, mas com certa reinterpretação do mundo adulto sob a perspectiva infantil com culturas e saberes próprios. E é por meio da brincadeira que se articula essas interpretações. Portanto, “o brincar define-se por uma maneira que as crianças têm para interpretar e assimilar o mundo, os objetos, a culturas, as relações e os afetos das pessoas”, segundo Wajskop (1995).

A posteriori, a autora descreve o ambiente, espaço, objeto de estudo, metodologia e agentes da pesquisa em si. Nessa explanação, Camila reitera que busca fugir ao foco adultocêntrico como linha de pesquisa e colocar a criança como elemento principal e não apenas como o papel de sujeito passivo a ela comumente empregado. Segundo Oliveira-Formosinho as crianças percebem, descrevem, analisa, interpretam contextos educativos com alicerce em suas experiências como pensam ser o mundo dos adultos.

A seguir, Camila Ohouan fala acerca das crianças e suas brincadeiras. No espaço lúdico construído em 2014 (trata-se de um evento anual) para ser semelhante a um salão de beleza verídico, as crianças costumam se divertir independente do comportamento delineado como feminino ou masculino e transitam (principalmente os meninos) na escolha do manejo dos materiais. Elas se divertem com a maquiagem disponível, as meninas tentam retratar o look adulto enquanto os meninos se surpreendem com as cores em profusão em seus rostos. Nesse ambiente, é possível ocorrer inclusive a ressignificação dos objetos trabalhados a exemplo da frase proferida por uma das professoras a um estudante chamado Júlio: esse esmalte aqui é do Homem-Aranha, você quer passar? Utilizando de um “mecanismo de incentivo” para associar aquele esmalte ao universo de masculinidade familiar aos meninos.

A autora comenta que, ao final da brincadeira, todos os meninos haviam usado esmalte. Sendo que alguns pediram para que a tintura fosse retirada antes de ir para casa. Um detalhe que chamou a atenção da autora é que, embora Júlio não tenha pedido para retirar o esmalte, ele escondia as unhas para que sua mãe não as notasse. Umas das mães de uma das crianças fora do grupo das pesquisadas comunicou à diretoria sua insatisfação e de seu marido com o fato de seu filho ter chegado em casa com as unhas pintadas.

Para Louro (1992), as características empregadas a cada sexo são tidas como extensões do que deve ser feminino ou masculino em nossa sociedade. Quando o responsável pelas crianças no momento de sua brincadeira não reflete sobre as possibilidades de exploração de novas experiências de aprendizado acaba reforçando.

Mais tarde naquele mesmo ano foi realizada uma brincadeira de super-heróis com as crianças. Durante sua organização constatou-se que uma ampla gama de fantasias masculinas de heróis como Batman, Homem de Ferro, Capitão América, Chapolin, etc. e apenas um tipo de fantasia de heroína, a de Mulher Maravilha. Essas opções dadas as crianças são projeções da imagem que determinada sociedade tem das crianças, a partir das quais elas devem se adequar e com base nas quais devem se identificar e cria imagens de si mesmas.

Já durante a realização da brincadeira, as meninas não aparentaram desagrado pela perceptível indisponibilidade de fantasias de Mulher Maravilha. As meninas e os meninos aproveitaram as fantasias e acessórios desníveis, bem como as atividades reservadas a esse dia (que exigiam certo esforço físico). Inclusive, tanto meninos quanto meninas trocavam de fantasia constantemente perante as possibilidades a serem exploradas. Mesmo com trajes tipicamente de heróis masculinos as meninas se denominavam do gênero feminino: eu sou a Mulher-Aranha! Por vezes as professoras alimentavam esse comportamento afirmando: você é Super-Mulher!

Ademais, as crianças fantasiadas brincavam de lutinhas. Como bem colocou Camila Ohouan, Kishimoto já dissera que esse tipo de brincadeira nada tem a ver com violência, mas pertencem a um como se dentro do imaginário infantil que estimula diferentes tipos de amadurecimento. Nesse experimento, o fato da carência de fantasias dedicadas exclusivamente para meninas pareceu incomodar mais os supervisores e os funcionários da escola do que propriamente as crianças. Entretanto, durante os intervalos do evento, foram observadas brincadeiras de lutinha entre os rapazes enquanto que as meninas não reproduziam nenhuma brincadeira de super-heróis.

Além disso, após uma visita ao Instituto Butantan na cidade de São Paulo, as meninas brincavam em um espaço aberto imitando as falas de algumas cuidadoras de cobra e demonstram certo conhecimento técnico da área devido a suas experiências prévias e mesmo ao assimilado durante a visita. Quando dois meninos tentam brincar de pedreiro no mesmo espaço, a professora os repreende e afirma que os mesmos estariam atrapalhando a brincadeira das meninas. Ela então sugere que eles ou brinquem em outro lugar ou que façam as vezes de vigias do Instituto Butantan, cada garoto optou por escolhas diferentes. Ao olhar da professora, ainda que sem nada pronunciar, estava presente a aprovação. Ohouan se pergunta o porquê da professora não ter sugerido que ambos, meninos e meninas, pudessem exercer a mesma função na brincadeira.

Depois desse episódio, Camila constatou uma certa brincadeira denominada de catapulga por uma das três meninas que dela participavam. A forma de brincar se dava pelo uso de uma corda que arremessava a menina que se encontrasse ao centro dela enquanto que as outras duas ficavam cada qual em uma extremidade, nesse tempo as crianças estavam estudando alguns construções medievais e a catapulta era uma deles. Essa foi uma das únicas vezes em que Ohouan avistou meninas brincando de atividades om desafio corporal intenso sem supervisão de um adulto, geralmente as brincadeiras das meninas são mais organizadas e sem grande estardalhaço. Para a autora tal brincadeira significa que, ainda que a frequência de

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