O Brasil, por mais de três séculos, conheceu a prática da escravidão
Por: Hugo.bassi • 23/12/2018 • 15.868 Palavras (64 Páginas) • 310 Visualizações
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“[...] todos têm direito ao trabalho e todo trabalho deve conter no mínimo as condições sociais conquistadas pelos cidadãos trabalhadores do nosso país”.
O trabalho escravo é um problema não só trabalhista. É também um crime de violação dos Direitos Humanos.
De acordo com o artigo IV da Declaração dos Direitos Humanos de 1948: “Ninguém será mantido em escravidão ou servidão, a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas”. E no artigo XXIII da mesma declaração: “Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego”.
A exploração do trabalho escravo é um crime contra a humanidade, que é punido pelo art. 149 do Código Penal Brasileiro e por declarações internacionais, como a Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho, Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e Convenção Suplementar sobre a abolição da escravatura de 1956. No entanto, infelizmente, ainda atinge milhões de pessoas no mundo.
Para a análise das jurisprudências foi aplicado o método indutivo e para a interpretação de textos legais, o método dedutivo. Os resultados indicam a distância entre as estruturas formais do direito e a realidade a que elas se referem. Embora a escravidão seja um crime contra a humanidade, a mentalidade de propriedade absoluta e de poder de dominação dos exploradores, construída durante a era colonial, segue em frente enraizada em toda a nossa sociedade, influenciando opiniões e sentenças e realizando a impunidade. As mudanças legislativas visando a proteção da dignidade do trabalhador somadas à construção do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, embora constituam importantes avanços na luta pela verdadeira abolição desse crime, não foram e não são suficientes para a mudança da concreticidade das relações sociais estabelecidas no âmbito brasileiro.
Existem leis, jurisprudências, acórdãos que falam sobre o trabalho escravo, entretanto, podemos perceber que o judiciário tem uma grande dificuldade de conceber o trabalho escravo como um fenômeno atual e distinto ocorrido no século XIX. A análise de jurisprudências indica que há um grande descompasso entre a necessidade de erradicarmos esse crime contra a humanidade e a persecução penal, pois menos de uma dezena de casos foram processados pelos Tribunais Brasileiros. Além disso, os Acórdãos demonstram uma resistência dos juízes em identificarem as características contemporâneas de trabalho escravo como realmente tipificadoras de um crime.
Diante desse quadro, a sociedade brasileira se organiza em diversas entidades como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Organização Internacional do Trabalho (OIT) e diversos Movimentos por Direitos Humanos para denunciar a verdadeira situação do trabalhador escravizado no Brasil. A criação dessas entidades já possibilitou o aumento do número de trabalhadores libertados.
Além disso, existe o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, que articula Governo Federal, Judiciário, Polícias e Sociedade Civil na realização de atividades emergenciais para o combate a esse crime. As estruturas administrativas do Grupo de Fiscalização Móvel, da Ação Policial, do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho estão sendo melhoradas. O combate à impunidade e à conscientização da sociedade são seus objetivos centrais.
Sabemos, entretanto, que o trabalho escravo é um problema estrutural da sociedade brasileira e, por esse motivo, não pode ser erradicado sem mudanças profundas no sistema judiciário e em nossa própria mentalidade. A existência de formas degradantes de trabalho está associada a diversas causas e fatores e na maioria das vezes está relacionado à falta de capacidade e de disposição dos Estados para erradicá-lo.
Normalmente, quem se utiliza dessa prática também é flagrado por outros crimes e contravenções. Desta maneira, o trabalho escravo torna-se um tema transversal, que está ligado a diversas áreas e por todas deve ser combatido. A própria Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE) é intersetorial, envolvendo diversas instituições estatais e da sociedade civil.
O Brasil fez progressos consideráveis na libertação de trabalhadores em condição de escravidão, entretanto não faz o suficiente para punir os responsáveis ou lidar com suas causas. Faltam penas e multas mais duras para os infratores e a devida execução das sentenças. As leis existentes não têm sido suficientes para resolver o problema e reincidentes são cada vez mais numeroso. Mesmo com a aplicação de multas, usar trabalho forçado ainda é um bom negócio para muitos empresários porque barateia os custos com a mão de obra.
No ano de 1995 a 2005, milhares de pessoas foram libertadas em ações dos grupos móveis de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As ações fiscais mostram que quem escraviza no Brasil não são empresários desinformados; são grandes empregadores que produzem com alta tecnologia para o grande mercado consumidor interno e até mesmo para o mercado internacional.
Quem escraviza nunca está sozinho. Há uma rede criminosa composta por vários agentes, cada um com finalidade própria, criada para exploração de seres humanos como fonte de riquezas.
O Ministério Público do Trabalho e o Ministério Público Federal têm tomado medidas confortantes em relação as punições para quem se vale do trabalho escravo. Na tentativa de atingir economicamente quem utiliza esse tipo de mão de obra, os Ministérios criaram e publicaram, com o apoio do governo federal, a “lista suja” do trabalho escravo no Brasil. Nela estão relacionados empregadores comprovadamente flagrados pela prática; estes, por sua vez, têm suspendido suas linhas de crédito em agências públicas, além de responderem por ações movidas por esses Ministérios.
As diversas modalidades de trabalho forçado no mundo têm sempre em comum duas características: o uso de coação e a negação da liberdade. No Brasil, o trabalho escravo resulta da soma do trabalho degradante com a privação de liberdade. O conceito de trabalho escravo é universal, logo todo mundo sabe o que é escravidão.
Assim Vieira (2003, p.3) constata que:
Quando se tem coragem para negar o passado e ignorar antigos amigos, pode-se fazer qualquer coisa em nome de uma “força estranha”, não palpável, mas presente como “O Grande Irmão”, tão presente que sentimos seu cheiro, sua presença, sua força e seu poder disseminado e entrando na verdadeira caixa preta,
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