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Direito das crianças e adolescentes na escolha de tratamento e recusa às terapias transfusionais

Por:   •  30/4/2018  •  18.217 Palavras (73 Páginas)  •  333 Visualizações

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Não aceitar tratamentos que envolvam infusão de sangue integral em virtude de crenças traz à tona temas fundamentais como o direito do paciente à escolha terapêutica e principalmente o direito à vida constitucionalmente defendido.

A recusa a determinados tratamentos que se baseie estritamente em convicções religiosas ou filosóficas deve ser respeitada da mesma forma, por imposição dos incisos VI e VIII do artigo 5º da Constituição Federal, que garantem a liberdade de crença e consciência.

2.2 Por que estudar o direito à escolha de tratamento médico?

Há necessidade de estudo sobre a escolha de tratamento médico visto que as terapias transfusionais não são aceitas por pacientes ‘Testemunhas de Jeová’, gerando polêmica e conseqüente preocupação médico-jurídica. Porém, existem métodos alternativos de tratamento que não são descartados por tais pacientes.

Corroborando o assunto, mister se faz enfatizar e jamais esquecer que o direito do paciente que não aceita sangue por convicções religiosas não é diferente do direito de qualquer pessoa de escolher o tipo de tratamento médico que deseja para si, o que se baseia nos princípios constitucionais do direito à vida e livre disponibilidade, dignidade, liberdade de consciência e crença, liberdade de culto, não privação de direitos por motivo de crença religiosa e privacidade. Ademais, a Constituição ao proteger a vida o faz em seu aspecto material (integridade física) e espiritual (convicções íntimas, filosóficas e espirituais).

2.3 Por que estudar o direito à recusa de terapias transfusionais?

É necessário o estudo sobre o direito à recusa de terapias transfusionais visto que a recusa a tais procedimentos, por motivo de crença religiosa, configura autonomia do paciente, fator fundante e derivado da garantia constitucional da dignidade da pessoa humana.

Tal garantia fundamental de dignidade tem reflexos sociais e individuais. Na seara individual dirá respeito aos direitos assegurados ao sujeito deste direito e as implicações em suas escolhas e comportamentos. Já na seara social e coletiva, versará sobre o dever do Estado e suas instituições constituídas em assegurar a concretização destes direitos para que ações individuais não interfiram nas ações alheias, com direitos próprios de outras pessoas ou de todos de uma dada sociedade.

Sendo dever estatal assegurar as garantias fundamentais, dentre elas o direito à recusa de transfusão sanguínea motivado por crenças religiosas, há que ser estudado tal assunto para que sejam tomadas medidas estatais para satisfazer a dignidade e restringir quaisquer atitudes que possam violar tais garantias individuais.

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3- OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS GARANTIDORES DOS DIREITOS DO PACIENTE

Diariamente médicos comprometem-se a aplicar suas habilidades, conhecimentos e experiências no combate às doenças, endemias e à morte. Porém, nem sempre a opção de tratamento médico é compatível com as expectativas do paciente. Tal colisão na escolha do tratamento adequado é muito vista em casos envolvendo Testemunhas de Jeová, em razão de não aceitarem tratamento com sangue integral, papas de hemácias, plasma ou plaquetas.

Na realidade, a formação médica, a licença para clinicar e as experiências médicas dão notáveis privilégios aos médicos. Porém, os pacientes, sejam eles Testemunhas de Jeová ou de outra religião, possuem direitos assegurados na lei e na Constituição, além dos princípios de Direito que lhes garantem a supremacia de suas escolhas, seja para preservar a dignidade humana, a vida, a liberdade, a privacidade, a ponderância de suas convicções religiosas e outros.

Enfatiza-se, ademais, que mesmo em casos de emergência e risco de morte, os direitos constitucionais do paciente continuam irrenunciáveis e protegidos, dentre tais direitos e garantias concentra-se essencialmente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, pilar da ordem constitucional que assegura a todos o direito de automaticamente fazer escolhas existenciais, podendo aceitar ou não determinados exames, tratamentos e procedimentos médicos.

À vista do princípio da unidade da Constituição, o intérprete não pode arbitrariamente escolher um ou outro direito fundamental, já que não há hierarquia entre normas constitucionais. Desta forma, na análise do caso concreto, o jurista, o magistrado e qualquer examinador do direito terá de vislumbrar qual solução será mais adequada à luz da Constituição.

O cerne da questão reside no fato de que tais pacientes não estão recusando tratamento médico, nem pretendem dispor da própria vida, como explicitado por Carmem Juanatey Dorado:

Não se pode qualificar de suicida a conduta de uma Testemunha de Jeová que, ao mesmo tempo em que se nega a que lhe pratiquem uma transfusão de sangue, está disposta a se submeter a qualquer tratamento alternativo para continuar vivendo. Em tal hipótese não se pode falar em vontade de morrer. (DORADO, Carmen Juanatey, 1994, p. 317).

Faz-se oportuno o comentário de José Luiz Quadros de Magalhães:

Acreditamos, no entanto, que o direito à vida vai além da simples existência física. (...) O direito à vida que se busca através dos Direitos Humanos é a vida com dignidade, e não apenas sobrevivência. Por esse motivo, o direito à vida se projeta de um plano individual para ganhar a dimensão maior de direito (...), sendo, portanto, a própria razão de ser dos Direitos Humanos. (MAGALHÃES, José Luiz Quadros de, 2000, p. 189).

Assim, o direito à vida, constitucionalmente defendido, envolve não apenas os elementos materiais e biológicos da pessoa, mas também os morais, emocionais e espirituais, que certamente lhe serão atingidos caso seja procedido o tratamento com o uso de sangue sem seu consentimento.

Isto porque, para os religiosos que acatam tal entendimento, esta questão envolve os princípios mais fundamentais nos quais se baseiam sua vida, sendo a recusa às transfusões uma regra de conduta a ser observada, ainda que a sociedade a ignore ou menospreze. São exatamente estes princípios íntimos pessoais que a Constituição Federal está a proteger.

Em suma, ao recusar um tratamento com hemotransfusão, o paciente não está fazendo nada além de invocar o próprio direito constitucional à vida, uma vez que esta engloba também os direitos de personalidade como

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