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Antropologia - Santuário Pajés - NOROESTE

Por:   •  19/9/2018  •  4.147 Palavras (17 Páginas)  •  199 Visualizações

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Dito isso, e com vistas a retomar o assunto central aqui tratado, constatou-se que os pais do Fulni-ô Santxiê ou João Mário Veríssimo, conhecidos como Phuwá ou Pedro Veríssimo e Many ou Maria Veríssimo, estiveram entre os primeiros indígenas a manterem contato com partes da área da antiga Fazenda Bananal. Isso se deu entre os anos de 1957 e 1958, quando chegaram a Brasília para trabalharem na construção da nova Capital Federal, onde permaneceram até fins da década de 1960 e o início da de 1970, ocasião em que retornaram para Águas Belas.

O próprio MPF, que vem acompanhando o caso desde os primeiros rumores de desrespeito aos direitos dos índios, reconhece na Inicial da ACP/MPF (página 66) que “Há indícios sólidos de que se cuida de área em que se observa, há mais de 30 anos, ocupação indígena tradicional, que se sujeita à proteção prevista no art. 231, da Constituição Federal de 1988”.

Mas, por razões que não dizem respeito à presente análise, os índios só deram início aos pleitos de reconhecimento da área como área de ocupação indígena longínqua, em meados da década de 1990. Segundo o MPF (página 8 da ACP/MPF), “Data de 1996 o primeiro requerimento formulado à autarquia, pelo indígena Santxiê Tapuya, para a regularização fundiária da área”.

Vários elementos inseridos, seja na Inicial da ACP/MPF, seja na Decisão proferida, confirmam que a terra vem sendo ocupada, pela comunidade indígena, desde data remota, que perpassa a data de promulgação da Constituição Federal (05.10.1988), definida como “marco temporal de ocupação” (para fins de reconhecimento de “ocupação tradicional”), conforme item 11.1 do Acórdão Pet 3.388 RR do STF (Petição 3.388 Roraima), proferido em 19.03.2009 (página 235 do Acórdão).

No entanto, a postulação formulada à FUNAI para regularização da área não prosperava. Não prosperava, porque a FUNAI entendia, conforme documentos ora examinados, que a área não preencheria os requisitos para ser reconhecida como terra indígena de “ocupação tradicional”, tendo em vista que as circunstâncias em que foi habitada não lhe conferiam a condição de “ocupação imemorial”.

É o quanto se infere do texto (extraído do Parecer Técnico 34/CGID/DAF/FUNAI, de 2009, que se reporta à área do Santuário dos Pajés) transcrito pelo MPF às páginas 6/7 da Inicial da ACP/MPF, do qual se reproduz o fragmento a seguir:

“A título de introdução, cabe informar que a análise indica que a Reserva Indígena Bananal não pode ser reconhecida como Terra Indígena tradicionalmente ocupada, sendo que este posicionamento está fundamentado no estudo antropológico realizado na área por Stella Matta Machado e no parecer de Rodrigo Thurler Nacif.

Ressalte-se que o fato de a FUNAI não reconhecer aquela área como tradicionalmente ocupada não significa negar que os índios têm direitos e que estes devem ser assegurados. Pelo contrário, apenas entende-se que a identificação da área como tradicionalmente ocupada não é a forma mais adequada para reconhecer os direitos sobre ela. Compreende-se que este não é o único formato jurídico por meio do qual se podem garantir os direitos territoriais indígenas, haja vista que no Estatuto do Índio (Lei 6001/73) reputam-se como “Terra Indígena” as terras imemoriais (ocupadas tradicionalmente), as terras de domínio e as reservadas” (...) [grifos da transcrição]

Assinale-se que, ao final desse texto, a expressão “ocupadas tradicionalmente” exerce função explicativa da expressão “terras imemoriais”. Ou seja, para a FUNAI, as terras tradicionalmente ocupadas haveriam que ser aquelas ocupadas de forma imemorial.

Esse entendimento da FUNAI persistia em 18.10.2011, dia em que foi celebrado acordo entre algumas das famílias residentes na Reserva Indígena do Bananal e a TERRACAP, a FUNAI e a ADEMI (Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal), conforme reportagem de Rafaela Céo, do G1/DF, veiculada em seu noticiário do dia:

De acordo com o procurador geral da Funai, Antônio Salmeirão, o estudo prévio feito por antropólogos diz que existem alguns indícios de que a área seja indígena, mas não conclui que a região era tradicionalmente ocupada. "Aquela não é uma área tradicionalmente ocupada. Esse é o entendimento da Funai." [grifos da transcrição]

Do Parecer nº 045/CGID/05, citado à página 17 da Decisão de mérito proferida na ACP/MPF, colhem-se as seguintes manifestações da FUNAI:

(...) Ocorre que, para esse caso, os dados coletados junto aos índios residentes do local não lograram preencher os fundamentos para justificar sua ocupação como terra tradicional, impossibilitando a continuidade dos estudos (ver Parecer n. 045/CGID/05, anexo ao processo da ACP/MPF).

Contudo, para proteção da comunidade indígena, a FUNAI prestará apoio jurídico necessário para o qual necessitamos do apoio dessa Instituição, a fim de buscar junto ao Governo do Distrito Federal a permanência dos mesmos onde atualmente ocupam, por usucapião ou, não sendo viável, a obtenção de lote(s) de terra(s) em outro setor do Distrito Federal que permita aos índios o convívio em comunidade, segundo seus usos, costumes e tradições. [grifos da transcrição]

A posição da FUNAI encontrava apoio na 2ª Vara da Seção Judiciária da Justiça Federal do DF, como se vê pela Sentença da MM Juíza Federal Clara da Mota Santos, proferida na Ação Cautelar 2009.34.00.038807-5, em 25.03.2012, a qual se encontra transcrita na Decisão da ACP/MPF às páginas 40/53, donde se colhem alguns trechos elucidativos (p. 40/41), a saber:

Em recente decisão de indeferimento de liminar em ação civil pública concernente à parcela ambiental do litígio (Processo nº 59586-02.2011.4.01.3400), tratei da circunstância de não ter sido, até o momento, construída uma prova suficientemente robusta para desconstituir o entendimento dos especialistas da Fundação Nacional do Índio no sentido de que não há tradicionalidade na ocupação da Comunidade Fulni-Ô Tapuya, para fins do art. 231 da Constituição Federal. Seria, por outro lado, adequada a constituição de uma reserva indígena no local das edificações da Comunidade englobando o espaço necessário à sua sobrevivência saudável, à perpetuação dos seus costumes, sem a criação de nenhum obstáculo à construção das quadras residenciais do Setor Noroeste.

O fato de o Supremo Tribunal Federal ter colocado a baliza do ano de 1988 para a definição das terras tradicionalmente indígenas NÃO significa

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