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A TRAUMATOLOGIA FORENSE

Por:   •  30/10/2017  •  3.762 Palavras (16 Páginas)  •  389 Visualizações

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Já os crimes de perigo, se consumam com o simples perigo criado para o bem jurídico, não necessariamente ocorrendo a lesão do mesmo, sem produzir um dano efetivo. Conforme preleciona Bitencourt, “nesses crimes, o elemento subjetivo é o dolo de perigo, cuja vontade limita-se à criação da situação de perigo, não querendo o dano, nem mesmo eventualmente”.[4]

Assim é que, ocorrendo dano efetivo superveniente, este será de forma preterdolosa, uma vez que a intenção do agente consistia somente em criar a situação de perigo. Outro aspecto dos crimes de perigo é que o perigo pode ser tanto individual como coletivo. O primeiro ocorrerá quando se “expõe ao risco o interesse de uma só ou de um número determinados de pessoas”, como expostos nos artigos 130 e 132 do CP; o segundo ocorre quando ficam expostos “ao risco os interesses jurídicos de um número indeterminado de pessoas, tais como nos crimes de perigo comum”, é o caso dos arts. 250, 251, 254 do CP.[5]

O perigo ainda pode ser concreto ou abstrato. Concreto é aquele que necessita de comprovação, isto é, precisa ser demonstrada a situação de risco corrida pelo bem jurídico tutelado. Para tanto, é necessária, impreterivelmente, a realização de perícia – não suprível por outros meios – para a constatação do perigo. Neste sentido, Bitencourt: “O perigo só é reconhecível por uma valoração subjetiva da probabilidade de superveniência de um dano”.[6]

Já nos crimes de perigo abstrato, não se exige que a conduta resulte em perigo, pois a “a lei contenta-se com a simples prática da ação que pressupõe perigosa”.[7]

Portanto, percebe-se que, nos crimes de perigo abstrato, o legislador criminalizou a própria conduta, não o perigo gerado por esta. Por isto “o perigo não é elemento constitutivo do tipo, senão um mero motivo do legislador, que realiza a valoração de uma presumida situação de perigo, que estima que possa derivar-se da prática de uma conduta para um determinado bem jurídico, porém sem produzir-se em realidade tal situação de perigo”.[8]

Logo, vislumbra-se que os crimes de perigo abstrato não buscam responder a determinado dano ou prejuízo social realizado pela conduta, senão evitá-la, barrá-la, prevenindo e protegendo o bem jurídico de lesão antes mesmo de sua exposição a perigo real, concreto, efetivo de dano. Ao fazer uso desta modalidade delitiva, quer o Direito Penal da atualidade proporcionar, ou melhor, dar a sensação de segurança ao corpo social. Neste sentido, Diego Romero ressalta a importância dos crimes de perigo abstrato:

A técnica dos delitos de perigo abstrato constitui-se numa das características mais visíveis do desenvolvimento atual das legislações penais, acentuando-se seu uso nos campos mais problemáticos da regulação positiva, nos quais se sente a necessidade de política de segurança mais aguda, como, por exemplo, no direito penal econômico e do meio ambiente, até mesmo para facilitar e diminuir os problemas processuais – dificuldades na produção de provas, na verificação dos sujeitos ativos - nas averiguações destes delitos.[9]

Deste modo, a definição jurídica das modalidades delitivas de crime de perigo abstrato, dependerá não da previsão de uma conduta com probabilidade concreta de dano, isto é, de um resultado efetivamente perigoso para a vida social, mas da prática de um comportamento simplesmente contrário a uma lei formal, em outras palavras, a simples realização de um ato proibido pelo legislador, sem causar necessariamente dano ou sequer um perigo efetivo à ordem jurídica.[10]

A tipificação dos crimes de perigo abstrato é – e tem sido - passível de questionamentos doutrinários e jurisprudenciais. Isso, porque, se o princípio da ofensividade condiciona a tipificação de uma conduta ao concreto, real ou efetivo, e comprovado perigo ao bem jurídico, não haveria que se falar em presunção absoluta de perigo, uma vez que esse ainda não foi externado.[11]

Esse é o entendimento de grande parte da doutrina brasileira. A exemplo disso expõe Bitencourt:

Para que se tipifique algum crime, em sentido material, é indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido. Somente se justifica a intervenção estatal em termos de repressão penal se houver efetivo e concreto ataque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mínimo, perigo concreto a um bem jurídico tutelado. Por essa razão, são inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstrato, pois, no âmbito do Direito Penal e de um Estado Democrático de Direito, somente se admite a existência de infração penal quando há efetivo, real e concreto perigo de lesão a um bem jurídico determinado.[12]

Segundo tal entendimento, o referido princípio não permite que o Direito Penal se ocupe com as intenções e pensamentos das pessoas, com seu modo de viver e com suas atividades internas, pouco importando se a conduta é imoral ou pecaminosa.

2. CONSIDERAÇÕES SOBRE O CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA FOGO

O ordenamento jurídico brasileiro trata dos crimes de arma de fogo nos artigos 12 a 21 da Lei nº 10.826/03 denominada Estatuto do Desarmamento, que revogou a Lei 9.437/97. Todavia, será analisado aqui somente o artigo 14 da mencionada Lei, haja vista ser o objeto da presente análise. Vejamos o que dispõe este artigo, in verbis:

Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.

Da leitura do artigo, extrai-se que sua objetividade jurídica, isto é, o bem jurídico tutelado pelo tipo penal, diz respeito à incolumidade pública, ou seja, à segurança da coletividade, à manutenção da paz e do sossego primados pelos indivíduos de uma sociedade. Magalhães Noronha, sobre os crimes que tutelam a incolumidade pública, sustenta dizem respeito ao:

(...) complexo de bens e interesses relativos à vida, à integridade corpórea e à saúde de todos e de cada um dos indivíduos que compõem a sociedade. Característico desses crimes é que ultrapassam a ofensa

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