A Sociologia como aplicação do direito
Por: Jose.Nascimento • 29/11/2018 • 3.965 Palavras (16 Páginas) • 436 Visualizações
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Os Poderes Executivo e Judiciário, com também advogados e tabeliães, por exemplo, são os chamados “agentes jurídicos”, encarregados de aplicar a lei, embora não sigam as previsões legais de forma absoluta. Isso ocorre porque quem aplica a lei dá ao texto um sentido próprio, que muitas vezes não coincide com a interpretação feita por outro jurista. Apesar de existirem regras de interpretação, que limitam a atuação do intérprete, há erros e tentativas de adaptá-la aos interesses individuais e à opinião popular. Caso contrário, a população desistiria de procurar a Justiça e optaria sempre por meios particulares de solucionar suas questões (segurança privada, vingança, etc), o que acarretaria em uma profunda crise de eficácia do Poder Público. Se a maior parte da população considera que denunciar quem pratica um crime não tem sentido, porque este nunca será punido ou porque há outros meios de ação mais eficientes, então a distância entre o crime e sanção oficial será ainda maior.
Sabadell cita como exemplo o consumo de pornografia na Alemanha, proibido pela legislação. Estatisticamente, foram investigados 4000 casos, no ano de 1996. Não é possível que, em toda a população alemã, ocorreriam apenas esses casos de pornografia, o que indica que a opinião popular e os órgãos repressores discordam da posição do legislador, considerando que nem todas as formas de pornografia são passíveis de punição. Assim sendo, a quota de eficácia das normas penais em questão é muito baixa.
A autora aponta que a falta de confiança na Justiça ou a impossibilidade de acesso à mesma é uma realidade brasileira. Segundo pesquisa de 1990, 67% das pessoas envolvidas em conflitos trabalhistas, civis ou criminais, não procuraram a Justiça. A sociologia jurídica demonstra um interesse particular pelo modo de atuação dos operadores do direito e pela opinião pública acerca do Direito, tentando melhor conhecer a vida jurídica real, ou seja, os mecanismos e os problemas de aplicação do Direito na prática.
2 OPERADORES DO DIREITO
Apesar das últimas pesquisas sobre o perfil dos juristas serem muito sofisticadas e apresentarem resultados muito diversos, destaca-se o crescente aumento do número de mulheres em inúmeras áreas do universo jurídico, ainda que a presença feminina nos tribunais de segunda instância e nos tribunais superiores seja ainda irrisório. Isso pode se dar pela recente tomada do universo jurídico pelas mesmas, ou pela persistência dos elementos da cultura patriarcal, que impõem uma seletividade de gênero, impedindo o acesso das mulheres aos tribunais superiores.
2.1 Magistratura
2.1.1. Posição constitucional da magistratura
Sabadell resume a posição dos juízes no sistema constitucional brasileiro nos seguintes termos:
a) Independência pessoal e funcional – evitar pressões e garantir a neutralidade da decisão;
b) Dependência absoluta da Constituição e das normas inferiores conformes à Constituição – garantir a aplicação fiel do Direito;
c) Princípio da indeclinabilidade da função de julgar – proíbe a denegação de justiça; o juiz tem a obrigação de dar uma resposta ao pedido das partes, permitindo a resolução definitiva de todos os conflitos jurídicos, mesmo quando a lei silencia ou é vaga.
O Iluminismo questionou se os juízes nada mais seriam do que “autômatos” e “vozes vivas do legislador”. Intérpretes e filósofos do Direito se posicionam de forma diversa, uns limitam a atividade da magistratura, baseando-se na teoria da democracia e na necessidade de segurança jurídica, enquanto outros admitem amplitude para a incidência de sua discricionariedade, recorrendo à escola moralista e ao realismo jurídico. A Sociologia Jurídica, por sua vez, interessa-se por ambos os pontos.
2.1.2 Perfil social da magistratura
“Em 1907, o líder do movimento revolucionário alemão Karl Liebknecht afirmou, na sua defesa contra a acusação de alta traição, que os tribunais do seu país apenas faziam 'Justiça de classe', buscando evidenciar que os juízes pertenciam a uma classe social privilegiada, de opinião conservadora e perseguiam o movimento socialista, aplicando a legislação do período contra os 'subversivos' de forma particularmente dura e, às vezes, claramente ilegal, na tentativa de combater o inimigo político”, cita Sabadell.
Diversas pesquisas apontaram que, no Brasil e em muitos outros países, a composição da magistratura diverge fortemente daquela de outras profissões, sendo perceptível a predominância de membros de grupos privilegiados, apesar da tendência de “abertura” e “democratização” do acesso ao Poder Judiciário, nas últimas décadas. O que não diz nada, entretanto, a respeito da atuação desses profissionais. É plausível supor que um juiz conservador e bem remunerado tente decidir a favor de outra pessoa de condições semelhantes, mas não há certeza de que isso ocorrerá. Aqui se encontra a mais importante crítica feita às pesquisas sobre a sociologia da Justiça.
2.1.3 Sociologia da atividade judicial
Passou-se, então, da sociologia do perfil da magistratura à sociologia da atividade judicial, a partir da análise de processos, principalmente na esfera penal. Constatou-se que a atividade profissional do magistrado é influenciada por uma série de variáveis, tais como:
a) Posição de classe (em geral superior);
b) Posicionamento político (em geral conservadora ou liberal-conservadora);
c) Socialização especificamente jurídica do modo de seleção e da atuação profissional, que dão ao juiz, em geral, uma visão legalista e autoritária da realidade social. A maioria dos juízes mostra particular zelo pela ordem; considera que a lei oferece soluções aos problemas sociais e exerce suas competências de modo formal e solene, optando por manter distância das partes.
Apesar da impossibilidade de supor uma lei sociológica acerca da atividade judicial, em função da homogeneidade constatada nas pesquisas, supõe-se que o exercício da magistratura caracteriza-se por uma dupla seletividade, tanto na aplicação quanto na interpretação da lei. Tendem a punir os mais fracos e favorecer os membros das classes superiores, da mesma forma em que tendem a utilizar as margens
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