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Relato etnográfico: Bar do Brejeiro – Cesário Lange

Por:   •  17/10/2018  •  1.291 Palavras (6 Páginas)  •  210 Visualizações

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“Olá! Cê é a filha do ‘seu’ Ferrrrnando né? Cêis vão querrrer o quê?”. O sotaque caipira dele é muito forte, o que me faz ter que pedir para repetir a frase em algumas ocasiões.

Solicitei um litrão de cerveja. Ele gritou para sua mulher e sentou em uma das outras mesas desocupadas, de onde tinha saído. Eram duas ao nosso lado, todas na varanda. Estava muito calor naquele dia e o ventilador barulhento não deixava a parte interna do ambiente menos abafada.

Apenas homens entravam no local. Tinha uma única mulher no balcão, claramente parente do dono. Os homens que apareceram ali estavam todos usando botinas e suas camisetas eram de campanhas políticas passadas ou de propaganda. Todos suados. Seus chapéus, molhados também. Estacionavam suas motos, iam até o balcão, pediam uma pinga e saiam. Pelo sotaque, para mim, era quase impossível entender o que era ordenado. Faziam um leve aceno de cabeça para o meu primo e cumprimentavam o Brejeiro. Minha presença era claramente ignorada. Alguns deles fumavam um tabaco com cheiro forte enrolados em palha de milho. Obviamente sem filtro. Foram cinco aparições destas no período em que fiquei tomando minha cerveja.

A população da região e, por consequência, todos os homens que adentraram o espaço é basicamente composta por descendentes de italianos, loiros e de olhos claros. Perfil cultural similar ao traçado por Antônio Cândido em seu livro “Parceiros do Rio Bonito”. Andam sempre de cabeça baixa e falam para dentro.

Foi estranho ver o brejeiro daquele jeito. Não se via mais mesas jogando truco aos brados e a disputada mesa de sinuca estava completamente vazia. Não havia nenhuma interação naquele ambiente.

Na hora de pagar, fui ao balcão e perguntei se podia fazê-lo depois. Andar a cavalo com a carteira no bolço é bem desconfortável. Ele disse que anotaria na conta do ‘Seu’ Fernando, que estava tudo certo e para eu aparecer mais vezes. Ainda mandou um abraço para minha família.

É possível perceber que houve ganhos materiais individuais para população que reside no bairro da Campininha. As pessoas têm maior acesso a informação com o grande aumento do uso de celulares, por exemplo. Há também acesso a luz, água, transporte, escola etc. Porém, ao mesmo tempo, a população se encontra empobrecida e sem trabalho.

Com todos esses eventos, perdeu-se o sentido comunitário do bairro que antes era tão forte e vivido nas minhas lembranças do Bar do Brejeiro, seja pelo êxodo rural, seja por que o local, com todo o aumento de direitos na região, perdeu seu sentido de espaço de construção conjunta.

Nesse sentido, é preciso uma política pública voltada para a geração de postos de trabalho e uma nova vocação econômica para o local para mudar a realidade existente. Desenvolver projetos que recuperem o espírito comunitário da região talvez fosse outro movimento interessante, pois organizaria a população novamente e a incentivaria a ir atrás de suas demandas.

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