Resenha crítica 'O Cortiço' de Aluísio de Azevedo
Por: Salezio.Francisco • 9/3/2018 • 1.483 Palavras (6 Páginas) • 478 Visualizações
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“Ele propôs-lhe morarem juntos e ela concordou de braços abertos, feliz em meter-se de novo com um português, porque, como toda cafuza, Bertoleza não queria sujeitar-se a negros e procurava instintivamente o homem numa raça superior a sua.” (AZEVEDO 2004: 007)
“Mas desde que Jerônimo propendeu para ela, fascinando-a com a sua tranquila seriedade de animal bom e forte, o sangue da mestiça reclamou os seus direitos de apuração, e Rita preferiu no europeu o macho de raça superior.” (AZEVEDO, 2004: 111-112)
Fica claro que, a verdadeira vontade da mestiça era a de embranquecer-se: se não lhe era possível tornar-se branca literalmente, se unindo a um homem respeitável por sua cor, ela poderia se tornar mais importante aos olhos da sociedade. Mas não eram somente os mestiços que queriam ascender socialmente, João Romão também passa por uma mudança para ascender socialmente, ai não pela questão da raça mas pelo prestígio social. Dessa forma, a mestiça que lhe servia para ser pilar para construir bens e para se “amigar” quando sentisse vontade, perde espaço para Zulmira, mulher que lhe daria o lugar na elite. O determinismo de Bertoleza que era totalmente resignada e só queria o mínimo, uma velhice tranquila, pode ser uma metáfora da situação do negro após a abolição. Podemos pensar ainda no fato de Aluísio ter retratado Bertoleza como cafuza, a mistura de índio com negro para mostrar claramente a dominação do branco sobre as duas raças numa única figura.
Pode-se afirmar que, para Aluísio, o cortiço nada mais é do que a representação pura do Brasil. Esse país que para ele envolvia as pessoas e as corrompia, devido à miscigenação que aqui foi criada. Quando Rita Baiana é tratada como o problema de Jerônimo, a imagem que passa é que o problema desse europeu trabalhador foi ter se deixado influenciar pela brasilidade e assim fazer parte do meio. E ele, por sua vez, não tem como resistir ao meio em que está e abandona suas raízes, personificadas na figura da Piedade. Essa brasilidade que o corrompe é basicamente a força do negro, ou seja, o fato de aqui estarem culturas tão diferentes convivendo faria com que a cultura superior se corrompesse à cultura inferior.
Este romance foi publicado em 13 de maio de 1890, exatamente dois anos após a abolição e os intelectuais deste período estavam pensando na questão da diferença
intelectual entre as raças e a mestiçagem era vista de maneira negativa para a ‘’evolução do homem’’. Aluísio chega a se perguntar se é possível um país mestiço se desenvolver. Como já pontuamos anteriormente, é um autor naturalista que se utiliza de aspectos como raça e meio ao longo de todo o romance e um exemplo disso é o Sol, que é retratado na obra como um personagem do cortiço: Jeronimo muda quando chega aos trópicos, Piedade ao ser trocada por Rita amaldiçoa o sol, é o determinismo do meio agindo.
O que o autor quer mostrar claramente é que não há como sair ileso dessa confusão de misturas que é o país, a não ser que não se deixe influenciar pelo meio explorado, e sim seja o explorador como é o caso de João Romão. Esse passa ileso a tudo isso por saber retirar de cada coisa o seu proveito: ele explora a cafuza diretamente, explora os moradores do cortiço, e depois se torna elite. Mas o autor acaba demonstrando que a ascensão social viria através da exploração dos mais fracos, e não por merecimento como os utópicos diriam.
Bibliografia.
AZEVEDO, Aluísio de. 2004. O cortiço. Rio de Janeiro: Ciranda Cultural.
CANDIDO, Antônio. 2004. O Discurso e a Cidade. Rio de Janeiro: Duas cidades.
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