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Resenha Crítica - O Queijo e os Vermes de Carlo Ginzburg

Por:   •  24/12/2018  •  1.749 Palavras (7 Páginas)  •  525 Visualizações

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Porém, com o passar do tempo Menocchio volta a falar sobre suas ideias, se tornando aparentemente mais radical, numa conversa com Lunardo Simon, reafirma todas as suas ideias mais polêmicas, falando que os cristãos só acham certo ser cristãos porque são cristãos (ideia retirada do conto dos três anéis), que cristo não tinha o poder de descer da cruz e que foram os padres que escreveram o evangelho ao invés de Deus. Após esse diálogo ele começou a se descuidar e espalhar suas ideias até que foi denunciado e preso mais uma vez.

Durante o interrogatório os inquisidores foram impetuosos, encurralando Menocchio, deixando-o sem respostas, tentando encontrar contradições em sua fala, após o interrogatório e com a ajuda de um advogado ele mais uma vez escreveu uma carta clamando por sua absolvição, porém sua condenação foi primeiramente à tortura, para que tentassem arrancar à força de Menocchio quem foram seus cumplices, porém ele não fala nada de útil. A congregação do Santo Ofício em Roma é informada e o cardeal de Santa Severina responde afirmando que Menocchio seria um ateu, então, enfim, ele é sentenciado à morte.

Devido à grande quantidade de capítulos no livro, existe dentro dele uma constante quebra de temática. Entretanto, entre as várias questões, algumas ganham destaque no decorrer da narração, principalmente alguns pensamentos metafísicos que revolucionam a mentalidade cristã medieval, os pensamentos referentes à hierarquia e a quebra da estrutura medieval dos processos inquisitoriais.

Logo no prefácio do texto o autor traz um assunto que é amplamente discutido por sociólogos como Pierre Bourdieu, porém numa perspectiva histórica, e que nessa obra de Ginzburg ganha um papel determinante, a análise das hierarquias culturais e sociais. Para Bourdieu, seria “o elemento da herança familiar que teria o maior impacto na definição do destino escolar” (NOGUEIRA, 2009. p. 52), e com destino escolar quer falar do nível cultural que vai atingir o indivíduo alvo do processo educacional. No contexto da idade média essa herança cultural seria algo como o sistema de castas medieval, que determinava a classe social de toda a população, com a grande diferença de que na idade média as classes populares eram impedidas pelas classes dominantes de ascender.

Porém, por mais que esse sistema de hierarquia social tente ser ao máximo imutável, determinista e estruturalista e nos engode a enveredar por esse caminho, alguns casos demonstram que para que as estruturas possam ser fundamentadas, a microhistória deve ser ignorada, pois ela mostra na prática as lacunas do estruturalismo. Menocchio é um desses exemplos, e um dos melhores conhecidos, seu nível cultural se confunde e fica entre o das classes populares e o do clero, ele sabe ler e escrever, mas ao mesmo tempo seu modo de pensar apesar de revolucionário está preso às culturas subalternas, porém essa criação de uma identidade popular é uma ameaça para as classes dominantes e “O caso de Menocchio se insere nesse quadro de repressão e extinção da cultura popular” (GINZBURG, 1976. p. 231).

O próprio protagonista vai criticar as hierarquias, comentando por exemplo que “o papa, os cardeais, os padres são tão grandes e ricos, que tudo pertence à Igreja e aos padres. Eles arruínam os pobres...” (GINZBURG, 1976. p. 62). E também na página 155 onde mostra uma fala de Menocchio afirmando que o inferno é uma mercadoria do clero com o intuito de induzir as pessoas obedecerem à doutrina católica.

Notável é o caráter incomum de Menocchio, alheio às estruturas sociais pré-estabelecidas e ditadas por historiadores como Fernand Braudel nos Annales e Louis Althusser no materialismo histórico. Ambos vão trazer uma visão aproximada, mas não igual, de estruturalismo, segmentos sociais que generalizam grupos e assim determinando como esses grupos são, se comportam, suas limitações e sua cultura, dentre outras características. O caso de Menocchio é curioso, pois ele não se enquadra em nenhuma das classes determinadas pelo estruturalismo, enquanto seu nível intelectual e sua habilidade de leitura se aproxima do clero, alguns de seus traços culturais e principalmente econômicos são marcas das classes populares, então como inserir o Menocchio na pirâmide social medieval levando em conta métodos estruturalistas? Essa pergunta se mostra irresoluta, o estruturalismo agora, por causa, também, da microhistória, está fadado à ruina.

Portanto, quando Ginzburg conta a história do Menocchio, não procura somente mostrar deliberadamente a história de um homem simples, mas construir por trás dessa história uma sublime reflexão sobre os complexos níveis de dominação na sociedade medieval, mostrar quais pensamentos configuram ameaça para as instituições religiosas da época, ou seja, até que ponto os comportamentos se mostram toleráveis e em que momento passam a ser imperdoáveis pelo Santo Ofício, além disso, ainda traz junto de si elementos preponderantes para desbancar a história estruturalista.

Porém, o livro conta como principal fonte os “relatórios” do julgamento de Menocchio, devido a isso têm-se um número de fontes oficiais muito reduzidos para se montar uma narrativa constante e impecável do ponto de vista literário, além de que, durante a narração o autor constantemente reforça as limitações nas fontes deixando algumas lacunas e quebrando a fluidez narrativa, como por exemplo a grande dúvida, se Menocchio leu ou não o Alcorão, distanciando assim o livro da literatura e aproximando do gênero histórico cientifico, logo, o livro cumpre seu papel historiográfico, apresentando uma análise magistral do caso do Menocchio e da

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