Auto da Barca do Inferno
Por: Lidieisa • 12/6/2018 • 1.891 Palavras (8 Páginas) • 343 Visualizações
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Onzeneiro (Agiota): Quanto é a passagem para o Paraíso:
Anjo: Acho que você não cabe, principalmente com esse saco de dinheiro!
Onzeneiro (Agiota): Se o senhor me deixar entrar, pode ficar com tudo.
Anjo: Mesmo assim, você não merece lugar aqui!
Onzeneiro (Agiota): Por quê?
Anjo: O senhor era agiota e cobrava juros altíssimos, era cambista e vivia nas costas dos outros. Vá procurar outra barca!
Onzeneiro (Agiota): Diabinho, querido. Olha quem voltou!
Diabo: Ih, voltou, é? O Anjinho não te aceitou?
Onzeneiro (Agiota): Na verdade, eu que não o quis. Aquela barca era muito apertada e achei que você usaria melhor o meu dinheiro.
Diabo: Sei, sei... Agora pega um remo e se vira.
Onzeneiro (Agiota): Meu Jesus, o que o senhor faz por aqui?
Fidalgo (Deputado) Meu filho, senta, rema e cala a boca.
Cena 3
Chega o Parvo (Nordestino alienado).
Parvo (Nordestino alienado): Ô di casa?
Diabo: Aqui, meu filho.
Parvo (Nordestino alienado): Bom dia, meu sinhô. Esse barcão é seu?
Diabo: Sim e estamos indo para o inferno.
Parvo (Nordestino alienado): Inferno? Não me faz gosto esse nome.
Diabo: Sobe logo, querido, vamos!
Parvo (Nordestino alienado): Inferno não! Painho me dizia que é do sete pata. Não subo! Vou procurar outra barca. Se o sinhô vai por inferno, cadê o barcão do céu?
Anjo: Bem aqui, meu caro.
Parvo (Nordestino alienado): Eu quero entrar ai.
Anjo: O senhor foi apenas um pobre que caiu na lábia de pessoas como o senhor Deputado...
Parvo (Nordestino alienado): Deputado: Esse aí me deu muitos botijão de gás e bolsa família, gente boa.
Anjo: Mesmo sendo vítima de outros, também cometeu seus pecados e não merece subir, mas também não merece o inferno.
Parvo (Nordestino alienado): Então para onde vou?
Anjo: Por enquanto fique aqui, o intermédio do céu e inferno.
Diabo: Blá, blá, blá. PRÓXIMO!
Cena 4
Entra o Sapateiro (Dono de uma multinacional).
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Ô DA BARCA!
Diabo: Chegou à ralé... Ô meu filho, não precisa gritar.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Mil perdões, estou meio atordoado, sabe, acabei de morrer. Pra onde estamos indo?
Diabo: Eu vou pro inferno, o senhor, eu já não sei.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Eu fiz primeira comunhão, acho que essa não é a minha barca.
Diabo: Você fez a primeira comunhão, mas não viveu o que ela prega. Acho que está no meu time, querido. Pode embarcar.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Me obrigue!
Diabo: Acho que não preciso disso.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Mas eu fui na missa, várias vezes.
Diabo: Missa de sétimo dia não conta.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Dia de finados?
Diabo: Você ta de zoação? A barca dos otários é bem ao lado.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Anjo? Posso subir?
Anjo: Não pode!
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Deus não vai me perdoar?
Anjo: A barca dos exploradores e interesseiros é bem ao lado.
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Só por que eu fui rico? Eu não explorava ninguém, nem fazia idéia, você é mentiroso.
Anjo: Você sabia sim e pode ir pra barca ao lado, por favor?
Diabo: Você quer ir pro inferno então?
Sapateiro (Dono de uma multinacional): Querer, eu não quero...
Diabo: É o melhor que você conseguiu em vida, agora entra! É Anjo, parece que estou no lucro. PRÓXIMO.
Cena 5
Entra o Frade (Padre) com uma moça, e um pastor. Pastor e Padre cantando.
Diabo: Estão felizes por quê? Vocês estão mortos!
Pastor: O céu nos aguarda, amorzão.
Padre: A vida toda pregando a palavra, agora que vem a recompensa.
Diabo: E essa moça?
Padre: É minha esposa.
Pastor: Mas você é um padre, padres não casam.
Padre: Não há nada que não se faça pelas internas. Além do mais, você é um pastor e vende pedacinhos no céu, e ainda tem trouxa que acredita.
Diabo: Senhores, contenham-se e subam na barca.
Pastor: Essa não é a nossa barca.
Diabo: Um padre que namora e um pastor que rouba, acho que é aqui mesmo.
Padre: Não tenho culpa se Deus me deu o dom da palavra e também uma bela moça.
Pastor: Cadê o Anjo?
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