O DIREITO À PRIVACIDADE E PODER DIRETIVO: ANTINOMIA NO DIREITO LABORAL QUE REFLETE UM DOS PERFIS DO JURISDICIONADO TRABALHISTA
Por: Salezio.Francisco • 31/5/2018 • 7.107 Palavras (29 Páginas) • 382 Visualizações
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Uadi Lammêgo Bulus (2011, p. 502) tratou do princípio da dignidade da pessoa humana, destacando-o como valor inato ao homem:
Este vetor agrega em torno de si a unanimidade dos direitos e garantias fundamentais do homem, expressos na Constituição de 1988. Quando o Texto Maior proclama a dignidade da pessoa, está consagrando um imperativo de justiça social, um valor constitucional supremo [...] A dignidade humana reflete, portanto, um conjunto de valores civilizatórios incorporados ao patrimônio do homem [...] A força jurídica do pórtico da dignidade começa a espargir efeitos desde o ventre materno, perdurando até a morte, sendo inata ao homem. Notório é o caráter instrumental do princípio, afinal ele propicia o acesso à justiça de quem se sentir prejudicado pela sua inobservância.
No dizer de Uadi, o princípio da dignidade da pessoa humana é alçado ao status de valor supremo, consistindo em núcleo basilar e informativo de todo o sistema jurídico-constitucional. Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado (2012, p. 43) analisando tal princípio, o definiu “[...] como diretriz cardeal de toda a ordem jurídica, com firme assento constitucional [...]”, o que de logo denota a sua importância como elemento unificador de toda a ordem jurídica.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso X, declara serem invioláveis a intimidade e a vida privada das pessoas. Tais direitos concretizam o princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado fundamento da Carta Magna. Na esfera infraconstitucional, o direito à privacidade também é protegido. O Código Civil de 2002 traz um artigo específico a respeito da matéria: “Art. 21 - A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”.
O direito à intimidade não é um tema recente, haja vista que remonta a tempos antigos. A necessidade de em alguns momentos querer ficar mais reservado, há muito tempo já existe[2]. A necessidade de proteção à vida privada foi, em 1948, objeto da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo XII, in verbis: “Ninguém será sujeito a interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques a sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra interferências ou ataques”.
Da mesma maneira, em 1950, em Roma, a proteção à vida privada foi resguardada pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no artigo 8º, 1 e 2, e, em 1969, no artigo 11 da Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, conforme, respectivamente, abaixo demonstrado:
Toda pessoa tem direito ao respeito de sua vida privada e familiar, de seu domicílio e de sua correspondência. Não pode haver interferência de uma autoridade pública no exercício deste direito, a menos que essa ingerência seja prevista por e constitua medida que, em uma sociedade democrática, é necessária à segurança nacional, à segurança pública, ao bem-estar econômico do país, a defesa da ordem e à prevenção de infrações penais, à proteção da saúde e da moral, o à proteção dos direitos e das liberdades alheias.
Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.
A intimidade é uma esfera que o homem tem em sua vida, que é reservada para si. Não há repercussão social, ou pelo menos não se quer que haja. São aspectos que envolvem apenas a própria pessoa na relação consigo mesma, cabendo somente a ela decidir sobre a divulgação ou não destes aspectos. Nesse cenário, enquadram-se as opiniões políticas, os sentimentos, os pudores, as convicções, segredos íntimos, etc.
O constituinte originário, ao proteger o direito à intimidade e à vida privada, concedeu liberdade a cada pessoa de fazer o controle sobre as informações que lhe digam respeito. Essa tutela é tão forte e garantista que nem mesmo o poder constituinte derivado decorrente, através dos representantes políticos, pode fazer emendas tendentes a abolir a proteção à privacidade prevista no artigo 5º da Constituição Federal, já que constitui cláusula pétrea.
Gilmar Mendes e Paulo Branco (2014, p. 280-281), abordando o tema do direito à intimidade, frisaram a sua necessidade, afirmando ser importante para a própria saúde mental, como se observa do seguinte trecho:
O direito à privacidade é proclamado como resultado da sentida exigência de o indivíduo encontrar na solidão aquela paz e aquele equilíbrio, continuamente comprometido pelo ritmo da vida moderna. A reclusão periódica à vida privada é uma necessidade de todo homem, para a sua própria saúde mental. Além disso, sem privacidade, não há condições propícias para o desenvolvimento livre da personalidade. Estar submetido ao constante crivo da observação alheia dificulta o enfrentamento de novos desafios. A exposição diuturna dos nossos erros, dificuldades e fracassos à crítica e à curiosidade permanentes de terceiros, e ao ridículo público mesmo inibiria toda tentativa de autossuperação. Sem tranquilidade emocional que se pode auferir da privacidade, não há muito menos como o indivíduo se autoavaliar, medir perspectivas e traçar metas.
A constituição Federal de 1988 ao prever a intimidade e a vida privada, pretendeu alcançar a esses a posição máxima no ordenamento jurídico. Em assim o fazendo, o legislador estabeleceu uma conduta positiva e outra negativa ao Estado. Negativa ao garantir a não intervenção do Estado na esfera privada do indivíduo, isto é, exigindo uma abstenção; positiva no sentido de obrigar o Estado a uma efetiva prestação a fim de garantir que a intimidade e a vida privada não venham a serem violadas.
Vale acrescentar que a intimidade se refere ao reduto mais restrito de alguém, algo que não pode ser invadido, violado ou exposto, muito menos em situações nas quais ocorre a subordinação, fator marcante na relação de emprego. Ou seja, os direitos à intimidade e à vida privada são plenamente compatíveis no âmbito da relação de emprego, de modo que o empregador fica obrigado a respeitá-los.
A relação de emprego é campo fértil para a ocorrência de lesões ao patrimônio moral dos empregados, em virtude da posição de desequilíbrio em relação
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