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A Antropologia Jurídica

Por:   •  22/3/2018  •  8.971 Palavras (36 Páginas)  •  344 Visualizações

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Outro aspecto importante é que a juridicidade implica um caráter obrigatório, ou seja, a possibilidade de aplicação de sanção. Contudo, esta não deve ser associada à punição.

Tendo em mente que a juridicidade engloba o direito, o autor destaca quatro propriedades comuns aos dois: a) os dois conjuntos normativos possuem uma visão particular própria de cada; b) juridicidade e direito compartilham os mesmo fundamentos, tendo como apoio as mesmas bases normativas: as ''normas gerais e impessoais (NGI), os ''modelos de conduta e de comportamento'' (MCC) e os ''sistemas de disposições duráveis'' (SDD); c) ambos organizam os quatro tipos de ordenamentos jurídicos de Le Roy: ordenamento aceito, negociado, contestado e imposto; d) convenção como modo partilhado de criação da norma/solução.

Le Roy considera que o direito caracteriza-se pela aspiração à autonomia, enquanto que a juridicidade tem sua marca na heteronomia (regulações ''vivas'').

Jean Carbonier indica dois ''teoremas fundamentais'' à sociologia jurídica. O primeiro afirma que o direito é maior que suas fontes formais. O segundo diz que o direito é menor que o agrupamento das relações entre os homens. Le Roy sugere um terceiro que consiste na hipótese de que a juridicidade engloba a concepção de direito fundamentada nas sociedades ocidentais.

O autor procura desenvolver a ideia de que o direito ultrapassa a concepção jurídica das sociedades ocidentais, que abrange também outras tradições jurídicas consideradas como ''arcaicas, primitivas ou atrasadas''.

Le Roy problematiza a ''teoria da regra jurídica'' de Jean Carbonnier que atribui uma universalidade ao fundamento do direito. Ele destaca a necessidade de descentralizar o direito universal do seu caráter ocidental, uma vez que ele não é partilhado por todas as tradições.

Le Roy possui a concepção de que a juridicidade não pode ser feita através da universalização impositiva de apenas uma experiência, pois esta visão específica não é adepta pelas demais culturas.

Étienne Le Roy faz alusão às cosmogonias africanas, cujo pensamento tem em vista multiplicidade, especialização e interdependência.

O autor propõe três fundamentos da juridicidade que substituem as categorias lei, costume e habitus por ''normas gerais e impessoais'' (NGI), ''modelos de condutas e de comportamentos'' (MCC) e ''sistemas de disposições duráveis'' (SDD), este último sendo observado pelo autor como o mais insólito.

O habitus traduziria maneiras de ser, agir e pensar, produto das maneiras de socialização, enquanto que o costume traduziria ''maneiras de fazer''.

Os ''fundamentos da juridicidade'' variam dependendo da tradição jurídica, e inclusive, o autor sustenta a tese de que esses fundamentos aparecem em todas as culturas ou tradições jurídicas.

Étienne Le Roy não ignora as afinidades que sua teoria mantém com o debate do pluralismo. O autor ressalta ainda que quando os debates relativos ao pluralismo jurídico começaram a se oficializar, duas linhas teóricas teriam se desenvolvido.

A primeira caracterizada como ''clássica'‘, a segunda como ''radical''. A distinção entre elas estaria no lugar que o Estado assume na regulação jurídica.

Le Roy apresenta quatro conceitos de pluralismo jurídico: a) de caráter positivista, em que a pluralidade jurídica seria analisada num contexto de hierarquia de normas as quais o Estado teria controle absoluto; b) ''pluralismo soft'' caracteriza-se pela pluralidade de soluções para uma mesma situação; c) ''pluralismo jurídico hard'' em que o indivíduo pode, numa mesma situação, utilizar mecanismos jurídicos de ordens jurídicas diferentes; d) a pluralidade como a base das relações sociais.

Na visão do autor, sua concepção aproxima-se do pluralismo jurídico hard, principalmente pelo fato de colocar o indivíduo no centro do pluralismo. No entanto, para ele, sua concepção não reflete no ''individualismo metodológico'' característico do pluralismo hard.

A teoria do multijuridismo de Le Roy é voltada a uma ideia pluralista do fenômeno jurídico, pois não o reduz. Le Roy destaca que a cultura ocidental seria estabelecida por uma representação de mundo unitarista, que ele qualifica como monolatria. Essa monolatria reduziria a diversidade social a uma unidade.

Essa redução do monologismo, no século XIX, teria estimulado o progresso das ciências e das técnicas do século XX. Mas também teria levado a complexidade dos fenômenos (principalmente os fenômenos humanos) a uma forma simplificadora.

Buscando problematizar o estruturalismo unitário, Étienne Le Roy qualifica os cinco ''mundos'' ou ''cidades'' apresentados por Luc Boltanski e Laurent Thévenot: a ''cidade inspirada'' fundada no ''princípio de criatividade''; a ''cidade doméstica'' referente às relações familiares; a ''cidade da opinião'' que visa o ''reconhecimento social''; a ''cidade cívica'' em que justifica-se a ação pela ''busca do interesse geral'' e a ''cidade industrial'' conduzida ''pelo imperativo da eficácia e da produtividade''. Uma sexta foi sugerida por Philippe Bernoux: a ''cidade do mercado'' visando a ''troca comercial''.

Le Roy destaca que a noção da existência de diversos ''mundos'' ou ''paisagens'', que possuem regulações próprias, está relacionada com a tese do multijuridismo (pluralidade de regulações para uma pluralidade de fenômenos).

A ideia de transmodernidade tem como objetivo colocar a contemporaneidade em um quadro fora das categorias ocidentais e os paradigmas. Segundo Le Roy, a questão da transmodernidade ganha destaque numa era marcada pela globalização e mundialização. Sendo assim, ela acarretaria ver o futuro tendo como exemplo as experiências humanas e também romperia com a visão evolucionista.

No Brasil, a concepção de Étienne Le Roy pode trazer contribuições importantes para algumas discussões e representações em destaque acerca do direito,

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