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A Presença da Mitologia no Canto primeiro de Os Lusíadas

Por:   •  24/4/2018  •  1.585 Palavras (7 Páginas)  •  440 Visualizações

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palavra “consílio” para indicar que os deuses faziam uma “reunião em assembleia”, quando pode ser confundido com a sua correspondente homófona “concílio” que designa a “reunião de prelados católicos” (CAMÕES, 1972).

Após a deliberação favorável de Júpiter aos lusitanos, “estabelece-se entre dois deuses, Baco e Vênus, um duelo cujo realce é maior quando se transfere as reminiscências particulares de cada deus da mitologia para as entidades das parábolas da Bíblia.” (SILVA, et al, 2009, p.7-8)

Em outras palavras:

A credibilidade duvidosa dos intentos de Baco e as rasuras em seu caráter elegem-no, dentro da epopéia, como o vilão que aglutina em si toda a intensidade do mal; como se confrontado com um espelho, essa imagem do mito é reflexo do diabo bíblico, que tenciona destruir e aniquilar os inimigos.

Nesse discurso surge Vênus, complacente e dedicada, capaz de mover céus e terras por seus protegidos. Essa figura feminina assemelha-se à outra de real valor e importância dentro da Bíblia Sagrada. Esse amor maternal da deusa é equivalente ao misericordioso amor da Virgem Maria, mãe dos necessitados. (SILVA, et al, 2009, p. 8)

Ferreira (1997, p. 9) afirma que os deuses são os verdadeiros dinamizadores da ação que gera o interesse narrativo de Os Lusíadas, pois que dão sustentação à ação do poema, ação esta que passa a ocorrer não só no plano Histórico, mas também no plano poético.

Não houvesse a intervenção do maravilhoso pagão, o poema seria nada mais que uma narração enfadonha de uma viagem por mar, um diário de bordo em versos, em suma, etnografia pura.

São os deuses que apoiam ou criam dificuldades à ação dos portugueses. O que movimenta Baco é o seu interesse pessoal, e o que movimenta Vénus, é igualmente o seu interesse pessoal. Camões indica isso na estância 34 do canto I:

Estas causas moviam Citereia,

E mais, porque das Parcas claro entende

Que há-de ser celebrada a Clara Deia

Onde a gente belígera se estende.

Assi[m] que, um, pela infâmia que arreceia,

E o outro, pelas honras que pretende,

Debatem e na porfia permanecem;

A qualquer seus amigos favorecem.

(CAMÕES, 1972, p. 26)

Onde no verso quinto “um” se refere a Baco, e no verso sexto “o outro” a deusa Vênus.

Logo, parece que tudo na epopeia funcionará em torno das vontades dos deuses e que serão os humanos meros joguetes das peripécias deles. Mas em se retirando a cortina que empana os olhos, ver-se-á que aos poderosos deuses foram atribuídas fraquezas humanas, conforme já mencionado: Baco, com sua inveja impregnada de imoralidades nas ações; Vênus, esmerada em afagar seus protegidos.

Para Saraiva (1992) os deuses olímpicos têm uma existência “real” e os heróis históricos são como meros títeres, quer dos próprios deuses, quer dos homens quando eles lhes dão ocasião para isso; diz ainda que os deuses olímpicos são os agentes reais e objetivos do Poema, ao passo que o sobrenatural cristão é uma simples ilusão subjetiva dos homens históricos.

Nessa perspectiva, o Deus cristão em Os Lusíadas apresenta-se como “orientador religioso, a bandeira hasteada, que vai à frente, nas grandes realizações. É Aquele que detém o poder de mudar o curso da humanidade.” (NASCIMENTO; OLIVEIRA, 2011, p.1346)

A presença simultânea do maravilhoso pagão e o maravilhoso cristão pode ser vista como ponto de confronto por alguns comentadores. Mas, para Ferreira (1997, p. 5) os deuses pagãos nunca se confundem com o deus cristão, e raramente se misturam com os homens; enquanto personagens da narrativa, desaparecem do plano da História de Portugal, e só se manifestam no plano da viagem.

Resultados da análise

Este breve ensaio teve a intenção de demonstrar que o poeta Luís de Camões faz uso da mitologia e do modelo canônico de epopeia cônscio do sentido histórico que perpassa todo o passado da literatura Ocidental. A apreciação do poeta pela mitologia foi a de criar com ela uma narrativa que tivesse alcance simbólico tal que propulsionasse os portugueses ao grupo restrito de humanistas desbravadores de mundos.

Camões ao perceber que toda a tradição da literatura desde Homero, inclusive a de seu próprio país, existiam em simultâneo, atemporais, e pôde com isso compor sua magnum opus em toda a magnificência tal como a conhecemos.

A presença da mitologia era parte principal do arcabouço estético que o período oferecia a Camões; e qualquer confronto que se tente criar entre o maravilhoso pagão e maravilhoso cristão não passa apenas de ruído de mentes ociosas.

Para nossa sorte, a obra resistiu às críticas e, como ocorre a todas as obras imortais, ela não dialoga apenas com o passado mítico-glorioso de Portugal, mas com o homem da contemporaneidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Ministério da Educação e Cultura. Edição Brasileira Comemorativa do Quarto Centenário do Poema, 1972.

FERREIRA, António Manuel. Duas Personagens de Os Lusíadas: Vénus e Baco: João Torrão (ed.), Actas do II Colóquio Clássico, Aveiro, Universidade de Aveiro, 1997, pp.215-231. Disponível em <http://www2.dlc.ua.pt/classicos/Duaspersonagens.pdf>.

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