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História Moderna

Por:   •  6/4/2018  •  5.539 Palavras (23 Páginas)  •  390 Visualizações

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Nos Evangelhos da Bíblia, podemos encontrar várias passagens em que Jesus defende a igualdade entre os sexos. Quando os fariseus lhe perguntaram se é permitido repudiar sua mulher por qualquer motivo, Jesus responde: “Não leste que o Criador, desde a origem, os fez homem e mulher e disse: ‘Assim então o homem deixará seu pai e sua mãe para ligar-se à sua mulher e os dois farão uma só carne? ’ Dessa forma, eles não serão mais dois, mas uma só carne. (Mateus XIX, 1- 9, e Marcos X, 1-9). [6]

No entanto, a Igreja sempre teve grande dificuldade em se pregar tal tese. Tal objeção se remete ao contexto cultural em que o cristianismo se difundiu: um contexto patriarcal de uma longa tradição de desapego à realidade terrena.

Analisando-se o Novo Testamento podemos notar que o apóstolo Paulo, também preconizou a igualdade entre os sexos, como quando escreveu: “(“Não há nem judeu nem grego [...], nem escravo nem homem livre, nem homem nem mulher: pois todos vós não sois senão um em Cristo Jesus” [Epístola aos Gálatas III, 8]).”[7]

Porém, o mesmo apóstolo também foi um grande propagador da imagem da mulher como um ser inferior e incapaz de se governar sozinha, sendo desta forma subordinada ao homem. Em uma passagem referindo-se ao relato da Criação, escreveu: ‘“não foi o homem, evidentemente, que foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem” (I Coríntios XI, 9)’[8]

Tais passagens revelam contradições, que nos remontam à dificuldade da Igreja em se admitir a igualdade preconizada por Jesus nos Evangelhos. Essas dificuldades têm sua raiz justamente no medo oriundo da mulher e no forte contexto patriarcal em que o apóstolo Paulo e os membros da Igreja viviam.

Assim como o apóstolo Paulo, há vários outros registros bíblicos que, influenciados pelas culturas patriarcais, denotam uma visão depreciadora da mulher. Santo Agostinho, a fim de se conciliar a igualdade nos ensinamentos de Jesus com tal visão desvalorizadora firmou-se na tese de que todo ser humano

(...) tem uma alma espiritual assexuada e um corpo sexuado. No indivíduo masculino, o corpo reflete a alma, o que não é o caso da mulher. O homem é, portanto, plenamente imagem de Deus, mas não a mulher, que só o é por sua alma e cujo corpo constitui um obstáculo permanente ao exercício de sua razão.[9]

O desejo que o homem sentia pela mulher, era denominado pelos dirigentes da Igreja, como um dos maiores pecados que o sexo masculino poderia cometer contra Deus. Assim, a fim de conter o forte querer dos homens pela sexualidade feminina, a Igreja passou a pregar a virgindade através da exaltação de Maria, sendo o ato carnal, atribuído como uma obra de Satã. No entanto, as negações do desejo do homem pelo sexo feminino, na realidade nos revelam uma tática dos clérigos que, privados pelo celibato, deveriam conter tais pensamentos e desejos.

O historiador Carlos Roberto Figueiredo Nogueira, em sua análise sobre a constituição da Igreja Católica e sua forte luta contra as demais religiões denominadas pagãs, nos descreve a representação e propagação da imagem de Maria como virgem e mãe pelo cristianismo, citando o discurso de Jeffrey Burton Russel, um notório medievalista e historiador da religião

A Virgem Maria de Deus encarnava dois aspectos do antigo simbolismo tríplice da mulher: a virgem e a mãe. Mas o cristianismo reprimiu o terceiro ponto, o tenebroso espírito da noite e o mundo subterrâneo. Este lado negro do princípio feminino não desapareceu, ao contrário, quando o poder da Mãe de Deus cresceu, desenvolveu a imagem maligna do espírito feminino. Nas religiões antigas, o lado negro estava integrado com a sua face luminosa, mas agora, inteiramente apartado da parte positiva do princípio feminino e reprimido, tornou-se totalmente mal. A esta situação, adiciona-se uma outra transformação. Nas religiões antigas, a porção maligna era relacionada com um ser espiritual, uma divindade, ou ao menos um “Demônio”. Mas, na Europa cristã, o arquétipo maligno foi projetado em seres humanos. (...). [10]

A virgindade instituída como sagrada, como uma virtude suprema, passou a ser um martírio para as mulheres, pois a partir dessa visão de um ato sexual impuro e devido à construção da imagem do sexo feminino como sempre mais inclinado a se iludir pelo maléfico elas passam a ser vigiadas obsessivamente pelos familiares e pela sociedade. Devendo se resguardar, mantendo todo o seu desejo e libido reprimido, pois uma vez deflorada, a mulher jamais encontraria quem a quisesse como esposa.

Para se compreender melhor todos esses pensamentos e visões, em relação à mulher devemos ter em mente certos fatores que permeavam a mentalidade da população, pois esta fora uma época marcada por pestes, cismas, guerras e por um grande temor do fim do mundo. Desse modo, tais catástrofes são atribuídas pela Igreja como obras de Satã, onde o diabo se encontrava personificado em todos os lugares e em todas as pessoas que a Igreja julgava estar compilando contra a “boa fé”, ou seja, contra o cristianismo. Assim,

em toda parte se vê o diabólico, o mundo inteiro é por ele invadido. E sua vítima é, por excelência, a mulher. Porque a mulher está mais predestinada ao Mal que o homem, segundo os textos bíblicos – “Toda a malícia é leve, comparada com a malícia de uma mulher; que a sorte dos pecadores caia sobre ela! (Eclesiástico 25:26) – e os primeiros teólogos cristãos.[11]

Desse modo, com o intuito de se conter tais elementos demoníacos, a Igreja introduziu uma mentalidade obsidional, acompanhada por um maior rigor pessoal. Nessas condições, pode-se presumir que todo libido e todo desejo carnal reprimido se transformaram em agressividade, pois não conseguindo conter tais “tentações” e desejos em relação ao sexo feminino, os dirigentes da Igreja as denominaram como um ser predestinado ao mal.

Dessa forma, os sermões ganharam destaque como uma poderosa arma contra Satã e seu instrumento na Terra: a mulher. Algumas pregações discorriam para manter a mulher ocupada, pois só assim não lhe sobraria tempo para pensar e nem agir de má fé, outros incitavam a violência afirmando que se uma esposa não obedecesse ao seu marido, para os mesmos não hesitar em lhe dar surras.

Assim, o discurso religioso, além de implantar um pânico coletivo, motivado pela presença constante do Diabo, também difundiu no imaginário e nas consciências dessa sociedade o medo da mulher. Em um de seus sermões, São Bernardino de Siena pregou:

É preciso varrer a casa? – Sim. – Sim. Faze-a varrê-la. É preciso lavar de novo as tigelas?

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