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Ensaio sobre a solidão

Por:   •  20/10/2018  •  2.817 Palavras (12 Páginas)  •  246 Visualizações

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Minha solidão não me livra de viver bem em sociedade, afinal nenhum homem é uma ilha, mais precisamos expurgar esta dependência que nos vincula a vida social, que exige que precisamos de outros para nos realizarmos, precisamos casar, ter filhos, ir aos domingos almoçar com os parentes, visitar um amigo distante, sair com a turma do trabalho para não sermos um extraterrestre no ambiente profissional. Desde pequenos somos ensinados a sermos amigos de todos, a quem devemos dividir nossos brinquedos, sermos bonzinhos; na adolescência o que mais desejamos é ter muitos amigos e com isso nos sentirmos aceitos, o paradoxo social contemporâneo é convivermos o dia a dia com tanta gente e ao mesmo tempo sentirmos solitários. Muitas são as situações que causam a solidão: a solidão da morte, a solidão decorrente da riqueza, a dos bem e mal casados, a imposta pelo trabalho atomizado, a solidão dos velhinhos rejeitados com suas memórias e muitas vezes abandonados nos asilos onde se tornam esquecidos dos familiares, a solidão das crianças órfãs, abandonadas ou que são obrigadas a viverem em instituições repressivas, existe a solidão gerada pelo próprio poder a solidão da loucura, e tantas outras.

“No contexto familiar, temos outro exemplo de produção de solidão negativa: os velhos, que não são mais suportados pelas famílias, e que tendem a ser delas isolados. Enquanto uma experiência ocidental antiga dava aos velhos um lugar de sabedoria e solidez, a nossa ensina que a velhice é um estorvo. Assim, a não ser que haja um desejo e um esforço de permanência familiar comum, a solidão do velho se faz de um modo bem difícil, pois ele é isolado da vida familiar normativa” (KATZ, 1996:53). Minha adorada, vó, Maria José (86), me disse recentemente que quando moça tinha tantos amigos, e com o passar dos tempos eles foram diminuindo, por que ela era a mais velha do grupo e com o passar dos dias ela ficou ‘obsoleta’ para eles, hoje ela vive em casa sozinha sem poder sair e com poucos amigos que vão visitá-la.

Essa solidão da velhice é tão presente hoje, que infelizmente não assusta, temos asilos lotados de idosos abandonados sem nem uma visita de filhos ou parentes, apenas os “caridosos de almas” que fazem um trabalho social, levando conversas e principalmente ouvindo, que é o que muitos querem, serem ouvidos. E a sensação que tem é que a culpa é dos idosos, que não se adaptam a nova vida dos filhos, e para não ficarem sós, são largados nos asilos por que filho nenhum tem tempo para olha-los. Para mim a grande falência da sociedade contemporânea é o total abandono dos valores de respeito com o próximo, a solidão é tratada a vida toda como se fosse uma doença, quando se é jovem, fazem de tudo para que ninguém seja assombrado pela temível solidão, “não, você tem que sair, não pode ficar em casa sozinho”, quando chega na considerada terceira idade é o oposto que vemos, pessoas sendo abandonadas por quem teria obrigação de cuidar delas.

Dados do IBGE de 2010 mostram que aumenta cada vez mais o número de imóveis com pessoas morando sozinhas, o Brasil já possui 6,9 milhões de domicílios com pessoas morando sozinhas, a maioria deles ocupada por homens solteiros. De acordo com o levantamento, eram 4,1 milhões de domicílios com morador único (9,2%), em 2000, e 12,1%, em 2010, um aumento de 68,3% na década. (IBGE, Censo 2010 – PNAD). Esta pesquisa aponta somente os sozinhos, portanto, deixa de revelar o sentimento de solidão, o que evidentemente revelaria um universo ainda maior desta população. Também revelam um significativo aumento de pessoas que vivem sozinhas por opção ou por imposição. Ter liberdade é a resposta mais dita por quem mora sozinho, chegar a qualquer hora, fazer seus próprios horários é o que mais motiva as pessoas a procurarem um espaço só seu, esta é a resposta mais conveniente na maioria, muitos, porem, não dizem que não conseguem conviver com as diferenças do outro. E tem aqueles que são forçados a viverem sós, quanto seu parceiro morre, ou seus pais, quando vai estudar em outra cidade, no caso de morte pode acontecer uma solidão que leve a depressão, há anos vivendo com seu marido, a mulher depois de ficar viúva pode não resistir a esta ausência e passar a viver sozinha pode ser um fardo que ela não vai suportar. No caso desta solidão forçada a pessoa pode sim adquirir doenças fruto desta perda de uma pessoa presente em sua vida por tanto tempo.

O filósofo alemão Heidegger afirma que “estar só é a condição original de todo ser humano” aquele conceito de filosofia é bem encaixado aqui, nascemos sozinhos e querendo ou não nossa morte se dá na solidão, fugimos de algumas solidões no decorrer da vida mas não por muito tempo, passeamos por ela como forasteiros ate que a tornamos parte essencial de nosso ser. Vivemos em família, que é outra condição pedida pela vida, como uma forma de aplacar os desejos dos outros, minha solidão esta sendo perdida com a iminente formação de uma família, lá vem mulher e filha para eu exercer meu papel de macho e cria-las, como manda a sociedade, mais não era isto que eu queria, pelo menos não agora, alguém me perguntou se era o momento certo para isso? não, a solidão vinha me causando um bem tão grande nestes anos que eu me negava a viver em família, fugir desde cedo da presença diária de minha família, queria meu espaço, meu canto onde não escutasse a voz de ninguém, onde eu me bastasse pra mim mesmo “tenho necessidade de solidão” (Nietzsche).

Sou um adepto de que o homem viva só até ter total conhecimento do seu EU, só então passe a viver com o ‘outro’ e eu não tenho esse conhecimento ainda. “Conhece-te a ti mesmo” esse aforismo grego na qual me baseava não se completou. Talvez seja inocência minha achar que iria ter tempo para me conhecer por completo, acredito que não há tempo para ninguém, porem eu necessitava de mais um pouquinho de minha escuridão solitária diária. Sócrates converteu esse lema “conhece-te a ti mesmo” em missão de vida, ele defendeu que o primeiro passo da sabedoria é o reconhecimento da própria ignorância, Sócrates procurou levar os homens a interrogarem-se a si mesmos para reconhecer a insensatez e a ignorância de si próprios e assim conseguir despertar as suas consciências.

Dolto (1998:451) explica: “somos feitos para nos comunicarmos uns com os outros. Há solidão quando não há contato com alguém com quem estabelecer trocas, por estar longe demais no tempo ou no espaço”. Em plena era de evolução tecnológica esperava-se que toda esta evolução aproximasse as pessoas, tornado o convívio social mais duradouro, ‘infelizmente’ não foi isso que aconteceu, esse avanço todo trouxe um

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