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Um Panorama Geral Sobre os Imigrantes Bolivianos na Região Metropolitana de São Paulo

Por:   •  24/12/2018  •  3.467 Palavras (14 Páginas)  •  325 Visualizações

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O início da referida imigração remonta à década de 1950, quando, em função de um convênio de intercâmbio cultural firmado entre Brasil e Bolívia (Ato Internacional n° 173 do Itamaraty¹), alguns estudantes vieram ao país em busca de qualificação acadêmica não disponível na Bolívia. Após o término dos estudos, muitos deles acabavam optando pela permanência na cidade, em razão das múltiplas ofertas de emprego com que se deparavam no dinâmico mercado de trabalho paulistano. Contudo, a permanência destes estudantes estava atrelada aos postos de trabalho que exigiam certa qualificação para serem ocupados.

Já a partir da década de 1970 e 80 o perfil do imigrante boliviano se altera, uma vez que se verifica a chegada de funcionários pouco qualificados nas oficinas de costura da cidade, dispostos a receberem salários bastante reduzidos para exercer a atividade.

Deste modo, caracteriza-se uma imigração voltada essencialmente para o trabalho (imigração laboral), mais especificamente, voltada para a costura,

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atividade inserida no universo da essencial indústria de vestuário do Século XX.

A baixa qualificação profissional dos imigrantes bolivianos, bem como a enorme dependência dos salários, ainda que baixos, para sustento de suas famílias, ligadas ao desconhecimento da legislação trabalhista brasileira, e à constante insegurança trazida pelo caráter ilegal da permanência desses imigrantes no país são fatores que fortalecem diretamente a ocupação de postos em oficinas de costura pelos bolivianos, que não desfrutam de condições legais para reivindicar qualquer direito e se submetem a condições degradantes.

É desta forma que o grande mercado do vestuário em São Paulo, que absorve tamanha quantidade de mão-de-obra, vem se ancorando em práticas ilegais para manter-se competitivo, lucrativo e explorador.

Do Trabalho nas Oficinas de Costura

Em linhas gerais, o perfil dos bolivianos que vêm para o Brasil em busca de trabalho nas últimas décadas é de jovens, solteiros, em sua maioria do sexo masculino (a presença feminina tem aumentado consideravelmente nos últimos anos), com nível de escolaridade médio. Contudo, a atividade que mais atrai os bolivianos na cidade de São Paulo é a costura.

Os bolivianos passaram a ser incorporados como trabalhadores temporários sem nenhuma forma de regulamentação trabalhista, tornando-se vulneráveis, seja pelo fato de considerável parte deles estar residindo irregularmente, de forma indocumentada no país, seja por exercerem atividade empregatícia de maneira irregular, sem contrato de trabalho devidamente regulamentado à luz do Código de Leis Trabalhistas. Esta situação possibilita a ação inescrupulosa dos patrões, que em alguns casos também são bolivianos que possuem oficinas de costura e exploram seus compatriotas.

Os trabalhadores bolivianos habitualmente residem nas próprias confecções onde exercem suas atividades. A maioria das confecções funciona de maneira clandestina, ou seja, sem alvará para o exercício de suas atividades. Ainda, destaque-se que os funcionários bolivianos reembolsam os donos das confecções pelos insumos utilizados durante a produção, incluindo o uso da máquina de costura, os gastos com moradia, água, telefone, luz e comida. Por conta de tais despesas, os trabalhadores acabam endividados e praticamente “presos”, condicionados àquela exploração. O trabalho é caracterizado como degradante, propriamente “sub-humano”, uma vez que a jornada de trabalho chega a alcançar 18 horas por dia, em um ambiente com condições insalubres,

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uma vez que muitas não possuem sequer ventilação e luminosidade adequadas.

As refeições são fornecidas pelo próprio patrão, normalmente três vezes ao dia, sendo café da manhã, almoço e janta. Há pouquíssima privacidade no local, onde simples divisórias improvisadas determinam os respectivos “cômodos” de cada funcionário -, cômodos estes que possuem apenas colchonetes e lençóis. Os diversos trabalhadores, incluindo casais e até famílias inteiras, convivem praticamente juntos durante quase todos os dias. A música boliviana é tocada incansavelmente a fim de tornar o ambiente mais confortante, ou ao menos mais suportável, tentando-se assim resgatar as boas lembranças e fazer com que o local se assemelhe mais ao seu país de origem.

Sendo assim, observa-se que a “escravização” destes trabalhadores no país é fundamentada na coerção psicológica e no endividamento perante seus patrões, que acabam por restringir tanto suas garantias e liberdades, como suas possibilidades de se desenvolverem e ascenderem economicamente. Todos os gastos, desde o transporte do país de origem até o Brasil até os gastos diários com comida e moradia são descontados do salário do trabalhador. Tais gastos ainda são superdimensionados, a fim de tornar a dívida do empregado praticamente impagável.

Com um salário baixíssimo, em torno de R$ 0,40 centavos por peça produzida e com tantos descontos deste salário, os funcionários são duramente prejudicados por este sistema de produção, que os pressiona a produzirem cada vez mais peças a fim de garantir o sustento de suas famílias e a quitação dos débitos provenientes da própria atividade que exercem.

Assim, nessa situação de subalternidade, a única possibilidade real de ascensão destes trabalhadores é reproduzir o mesmo esquema de exploração com outros compatriotas ou até parentes, que chegam em São Paulo. O mecanismo de exploração parece ter sua engrenagem mantida conscientemente, não só pelos bolivianos, mas pelos latino-americanos em geral, onde nem os próprios familiares escapam do sistema exploratório já consolidado.

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Imagem de uma oficina clandestina de costura encontrada na região do Brás.

Após meses exercendo a atividade abusiva descrita acima, os imigrantes que finalmente conseguem quitar seus débitos, vislumbram a possibilidade de abrirem suas próprias oficinas e conquistar melhor posição socioeconômica.

Desta forma, alguns dos bolivianos deixam de ser mera força de trabalho recrutada para se transformarem também em pequenos empreendedores, donos

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