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O MILITAR E O ÍNDIO: A INFLUÊNCIA DAS FORÇAS ARMADAS NA POLÍTICA INDIGENISTA BRASILEIRA

Por:   •  9/2/2018  •  Dissertação  •  5.955 Palavras (24 Páginas)  •  335 Visualizações

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Projeto: O militar e o indio

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O MILITAR E O ÍNDIO: A INFLUÊNCIA DAS FORÇAS ARMADAS NA POLÍTICA INDIGENISTA BRASILEIRA

Projeto de pesquisa submetido à seleção do doutorado em políticas públicas, do Programa de Pós-graduação em Políticas Públicas - PPGPP da Universidade Estadual do Ceará.

Linha de pesquisa: Estado, Democracia e Políticas Públicas.

Fortaleza, maio de 2017.

1. INTRODUÇÃO

A questão indígena compreende uma complexidade de temas como desenvolvimento rural, política agrária e fundiária, direitos humanos, política externa, sanitária, de saúde, ambiental e defesa nacional. O presente trabalho discute a atuação do Estado e, particularmente, das Forças Armadas junto aos povos indígenas, identificando o discurso e a ideologia estatal por meio da análise das políticas indigenistas adotadas pelo país após o fim do regime militar.

No início do séc. XX, o modelo integracionista/assimilacionista – implementado a partir de uma ideologia de matriz nacionalista e positivista – conferiu às populações originárias uma condição transitória, em que fossem rapidamente integradas economicamente à sociedade brasileira como contingente de reserva de mão-de-obra para o trabalho ou mesmo como produtores de mercadorias. O proposito inicial seria dar impulso às economias regionais em expansão que, a partir daí, poderiam integrar-se às regiões mais desenvolvidas do país. Especificamente, investigarei os motivos pelos quais o integracionismo, que norteou a ação indigenista nos governos militares, ganha força nos dias de hoje como subterfúgio teórico e ideológico para respaldar os interesses corporativos dos militares, especialmente no tocante à demarcação de terras indígenas na faixa de fronteira[1].

Para os militares, as necessidades estratégicas do país não podem prescindir da ocupação das fronteiras, com a presença das organizações militares na fronteira amazônica, especialmente dos Pelotões Especiais de Fronteira (PEF). O apelo à soberania nacional e à ocupação econômica dos vazios demográficos nas fronteiras vem ganhando força no discurso dos militares nos anos 2000.

Meu objetivo neste trabalho é traçar um panorama sumário das relações entre militares e indígenas após a promulgação da Constituição Federal de 1988. A hipótese norteadora desta pesquisa é de que a influência dos militares na política indigenista está vinculada a um projeto nacional “modernizante” inconcluso. Mesmo sob o regime democrático, o processo de aniquilação dessas populações se atualiza através de políticas indigenistas subordinadas às pressões de poderosos interesses políticos e econômicos.

A estreita relação entre indígenas e as Forças Armadas (FFAA) marcou a política indigenista oficial moderna. Os militares, sertanistas, indigenistas e até mesmo intelectuais como Darcy Ribeiro decantaram o marechal Cândido Rondon como patrono de um modelo de “proteção” e “pacificação” do índio diante do avanço das frentes agrícolas e de infraestrutura (estradas e telégrafos). Mas como permanece tal legado se a missão rondoniana se vinculava a um padrão genocida/etnocida, na medida em que os grandes empreendimentos do desenvolvimento nacional se delineavam sob coordenação estratégica dos diversos governos e instituições militares[2]? Que força persuasiva eterniza um marechal, típico executor das políticas hoje tão criticadas por indigenistas, naturalistas e antropólogos a ponto de manter como troféu a escrivaninha, a poltrona e a máquina de escrever na entrada do edifício sede da Funai?

Os eixos condutores da política indigenista oficial no período militar se basearam nos princípios da Doutrina de Segurança Nacional, concebidos a partir do binômio “desenvolvimento e segurança”[3]. Em 1967 a recém-criada da Fundação Nacional do Índio – Funai surgiu da tensa relação entre o reconhecimento da autodeterminação dos povos originários e os desígnios de um programa nacional de desenvolvimento “modernizante”. O órgão se revelaria incapaz de atuar sobre as recorrentes violações dos direitos indígenas, sobretudo em dois pontos: demarcação de terras e gerência sobre os impactos da implantação de grandes obras estruturantes nos territórios demarcados.

As instituições que executam políticas indigenistas, tanto nos governos militares quanto na democracia, atribuíram ao índio um regime de "autonomia vigiada", ainda que a legislação brasileira tenha superado essa condição. É nesse sentido que a as FFAA têm se alinhado nos últimos anos a setores ligados ao agronegócio, reforçando o discurso de que é preciso rever a forma como são demarcadas as terras indígenas no país, sobretudo na faixa de fronteira, onde se encontra grande parte das populações indígenas. O principal argumento é o risco à violação da soberania nacional, dada a atuação de Ong’s nesses territórios e enfraquecimento e insegurança jurídica para atividades econômicas estratégicas.

Eminentes comandantes militares têm se manifestado contrários à política demarcatória, opondo-se à principal bandeira de luta do movimento indígena nacional. Em 2008, ao se referir sobre a demarcação da TI Raposa Serra do Sol, o comandante militar da Amazônia, General Augusto Heleno, classificou a política indigenista brasileira como “lamentável e caótica”. O General-de-Exército reformado Luiz Gonzaga Schroeder Lessa, ex-presidente do Clube Militar, ex-comandante militar da Amazônia ao expor o seu descontentamento com a indicação do ex-chanceler Celso Amorim para o Ministério da Defesa, o criticou por ter deixado ser aprovada na ONU (Organização das Nações Unidas) a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, que “afronta a soberania brasileira” (LESSA, 2011). O general da reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva, membro da Academia de História Militar Terrestre, em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, afirmou que as terras indígenas passaram a constituir um problema para a soberania nacional, desde que o Brasil ratificou a Declaração da ONU sobre os povos indígenas em 2007. (GUEDES, Sylvio; BRASIL, Thâmara; PAGANINE, Joseana, 2012.p.59). Muito embora a Constituição Federal reconheça o processo demarcatório como um ato meramente

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