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Resenha Verdade e Formas Jurídicas

Por:   •  21/4/2018  •  6.726 Palavras (27 Páginas)  •  324 Visualizações

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1. Introdução

Apresentaremos no presente trabalho um estudo da primeira e da segunda conferência realizada por Michel Foucault na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro entre 21 e 25 de maio de 1973 publicada no livro A Verdade e as formas jurídicas.

Nessas e nas demais conferências o autor analisará, por meio do estudo das práticas jurídicas ou judiciárias e dentro de uma perspectiva histórica, as relações entre poder e saber em diferentes períodos: Antiguidade, Idade Média e contemporaneidade; propondo que nos libertemos de determinados conceitos e procedimentos envelhecidos e cristalizadores, presos a ideia de continuidade.

Foucault apud Fonseca (2009) rejeita aquele pressuposto epistemológico, segundo o qual a realidade “existe”, e existe independente do sujeito, e pode ser abordada e conhecida diretamente, dependendo tão somente de uma intervenção mecânica do historiador que teria, assim, acesso ao real sem maiores mediações, produzindo um conhecimento que teria possibilidade de representar este real com fidelidade (ou espelhar o real)

Para o filósofo, isso não é possível, pois discursos e práticas que envolvem os discursos só podem ser compreendidos a partir de sua historicidade. Não existe em Foucault apud Fonseca (2009) um discurso que seja trans histórico, que atravesse todas as épocas e seja universalmente válido. O “real”, a “verdade”, são afirmações que dependem da apreciação específica do modo como funciona cada uma das regras de produção de conhecimento que presidem cada configuração discursiva diferente na história. Como diz o próprio Foucault, num texto bastante citado intitulado A poeira e a nuvem:

“Não há o real no qual se iria ao encontro sob a condição de falar de tudo ou de certas coisas mais “reais” que as outras, e que falharíamos, em beneficio de abstrações inconsistentes, se nos restringíssemos a fazer aparecer outros elementos e outras relações. Um tipo de racionalidade, uma maneira de pensar, um programa, uma técnica, um conjunto de esforços racionais e coordenados, objetivos definidos e perseguidos, instrumentos para alcança-lo e etc; tudo é algo do real, mesmo se isso não pretende ser a própria “realidade”, nem “a” sociedade inteira” ( Fonseca, 2009)

Para Foucault só se explica a verdade (ou o que se entende como tal em determinada época) a partir dos critérios – profundamente datados - em que ela é forjada. Toda verdade provém de um discurso que tem regras muito delimitadas (e nada metafísicas) para a sua produção.

O autor polemiza, portanto, as tentativas de “eternizar” os conceitos – e, portanto, o “eternizar” das instituições e das formas de se apropriar dos discursos.

De fato, se tomarmos a grande dualidade teórica moderna na abordagem do direito (que são as concepções jus naturalista e jus positivista),perceberemos claramente esta tendência, em ambas as correntes, de “desistoricizar” conceitos e instituições para o fim de escrevê-los numa “trans - historicidade”, numa “eternidade” que é tida como dada.

De imediato notamos, com Foucault, a precariedade do nosso saber. Seu surgimento pode ser relacionado com uma série de conexões com determinados discursos e também com determinadas estratégias de poder coligadas aos discursos – e não, como frequentemente se supõe, a uma branda, inocente, progressiva e isenta busca da “verdade”. Afinal como diz nosso autor, nas trilhas de Nietzsche:

“[...] não há uma natureza do conhecimento, uma essência do conhecimento, condições universais para o conhecimento, mas que o conhecimento é, cada vez mais, o resultado histórico e pontual das condições que não da ordem do conhecimento.”. ( Fonseca, 2009)

A principal consequência desse olhar foucaultiano sobre a história é a tentativa de liberar o conhecimento histórico de toda a tentativa de universalização e totalização. A expressão do nosso filósofo é menos a história de uma prática racional do que a história da racionalidade de uma prática.

Foucault quer demonstrar como os estudos sobre o homem, decorrem das características de um terreno epistemológico muito preciso e delimitado, que teve seu surgimento numa época muito determinada, que ele chama justamente de “era da história”.

Como diz Foucault,

“[...] a história de um conceito não é, de forma alguma, a de seu refinamento progressivo, de sua racionalidade continuamente crescente, de seu gradiente de abstração, mas a de seus diversos campos de constituição e de validade, a de suas regras sucessivas de uso, a dos meios teóricos múltiplos em que foi realizada e concluída sua elaboração”. ( Fonseca, 2009)

A descontinuidade passa a ser “ao mesmo tempo instrumento e objeto de pesquisa, delimita o campo de que é efeito, permite individualizar os domínios”.

Nessa linha, o próprio Foucault adverte, em A arqueologia do Saber:

“Denunciaremos, então, a história assassinada, cada vez que em uma análise histórica – e, sobretudo se trata do pensamento, das ideias e dos conhecimentos – virmos serem utilizadas, de maneira demasiado manifesta, as categorias da descontinuidade e da diferença, as noções de limiar, de ruptura e de transformação, a descrição das séries e dos limites. Denunciaremos um atentado contra os direitos imprescindíveis da história e contra o fundamento de toda historicidade possível” . ( Fonseca, 2009)

É com esse entendimento e esse olhar que Foucault analisará a tragédia de Édipo-rei de Sófocles, na segunda conferência, demonstrando as relações entre poder e saber na sociedade grega. Interpretando a peça de Sófocles como um retrato de seu tempo, que conta a história da transformação de uma sociedade marcada por um poder-saber do tirano, para uma sociedade democrática.

Essa sociedade ao permitir a busca da verdade, opondo esta verdade inclusive aos governantes, dá espaço para a elaboração das formas racionais de prova e de demonstração, para a arte de persuadir e para o desenvolvimento de novos tipos de conhecimento.

“Édipo-Rei é uma espécie de resumo da história do direito grego. Muitas peças de Sófocles, como Antígona e Electra, são uma espécie de ritualização teatral da história do direito. Esta dramatização da história do direito grego nos apresenta um resumo de uma das grandes conquistas da democracia

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