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Trabalho e relatório de campo: Casa de Swing Troca de casais, ménage e voyeurismo

Por:   •  27/10/2017  •  9.727 Palavras (39 Páginas)  •  851 Visualizações

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Denys Cuche, no texto “O bom uso do relativismo cultural e do etnocentrismo”, põe em cheque essa polarização conceitos. O autor propõe que etnocentrismo não deve ser encarado como racismo. Respectivamente, um é considerado um fenômeno sociologicamente normal e o outro, uma perversão social. Viver regido pela sua própria cultural é aceitável, pois tem a função positiva de preservar sua existência. Já o preconceito reside na exacerbação da idéia de supremacia, relegando ao “outro” um caráter irrevogavelmente inferior.

Cuche acredita ser inevitável o comportamento etnocêntrico, e afirma que o investigador não deve abandonar essa lógica por inteiro. Defende o uso metodológico do etnocentrismo, em que se concebe que o outro nunca é inteiramente outro, e que se compartilha algo na natureza humana. O etnocentrismo pode ser uma condição para a compreensão da alteridade, pois a relativização “total” impede que conheçamos uma cultura diferente. O investigador com certa dose de etnocentrismo descobre que o outro também é etnocêntrico e entende seu posicionamento como íntegro em sua própria cultura.

Os princípios metodológicos do relativismo cultural e etnocentrismo surgem, portando, como complementares para Cuche, enquanto Everardo Rocha ainda acredita na oposição desses conceitos. Ler Cuche após Rocha foi bastante valioso para a nossa avaliação e percepção do campo. Enquanto o autor francês nos mostra que devemos equilibrar esses métodos, o brasileiro nos deu uma visão um tanto limitada de como interpretar o “outro”. Uma postura que abandona seu ponto de referência, isto é, sua própria cultura, é simplesmente impossível.

Denys Cuche ainda argumenta que a proposta de fazer uso do relativismo ético (neutralidade e respeito absoluto da alteridade) pode ser uma máscara para sentimentos hostis. Crer na igualdade cultural pode esconder uma aparente “pena” do outro, o que marginalizaria as diferenças ainda mais.

O autor foi essencial para a compreensão do grupo de que não seria necessário sermos 100% condescendentes: poderíamos usar o etnocentrismo a nosso favor. Saber que os swingueiros acreditam que esse estilo de vida deveria ser adotado por todos é entender que eles também tomam uma atitude etnocêntrica em relação a nós. A conclusão é que nós nos nivelamos com esse pensamento, somos instigados a conhecer sua cultura e ainda conseguimos fazer um relatório de campo suscetível a nossa subjetividade.

Enquanto inicialmente eles nos rotulavam como “caretas”, nós os chamávamos de “pervertidos”, e esses juízos foram se atenuando ao usarmos o relativismo de forma consciente, considerando as motivações dos swingueiros, seus repertórios de vida e esse tipo de cultura como um todo. O exame atento nos fez perceber que chegávamos a entender o fato de eles fazerem swing, e que, de alguma forma, não mais condenávamos firmemente aquela prática de troca de casais. Criamos até certo respeito pela atitude revolucionária de romper com a monogamia que impera em nossa sociedade, mas permanecemos imersos em nossa própria posição. Entendemos que relativizar não é desistir de quem você é, ou seja, os integrantes do grupo se tornaram “saudavelmente” etnocêntricos e relativistas.

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“Idéias do canário”, de Machado de Assis, evoca uma interessante reflexão sobre o universo do "outro", que revoluciona visões de mundo. O canário, personagem central da história, conta com naturalidade a inversão de papéis de quem é o dono de quem. Propondo que o próprio animal comandava o homem, já que ele o alimentava e lhe dava uma boa morada, pode-se conceber essa metáfora como questionadora da posição suprema do ser humano na natureza. Além disso, podemos supor que nenhuma verdade é absoluta, e que tudo pode ser interpretado subjetivamente.

Machado sugere com uma narrativa "inocente" o quanto todas as coisas são determinadas pelo olhar de quem vê, e que não existem fatos, apenas interpretações. O canário afirma o quanto suas opiniões são evidentes, como se dissesse ali uma verdade universal; algo que acontece recorrentemente para os homens, que transmitem suas opiniões como se fossem imutáveis e reais.

O texto pode ser entendido como uma crítica ao etnocentrismo, posição passível de impedir o conhecimento por meio da afirmação exacerbada da própria cultura em detrimento de outras. Condena-se uma visão unívoca da existência, sugerindo que a exaltação de uma só visão é ignorante, e que devemos relativizar verdades. Ainda percebemos que o pássaro afirma que o mundo é como ele o vê, seja como uma loja de belchior ou como um jardim. Dependendo de onde ele está, sua verdade se transforma e seu passado já não importa mais. Essa mudança de atitude é uma alusão à influência do meio sobre o indivíduo, marcado pela cultura de um local específico e adaptado de acordo com os costumes ao seu redor.

A noção de influência direta do ambiente sobre a cultura do indivíduo traz a óbvia conclusão de que um bebê só irá falar japonês se for acolhido por japoneses. A linguagem e os costumes vão tatuar a vida do ser humano, a princípio capaz de se adaptar a qualquer variante da cultura dos homens. Portanto, para o trabalho de campo na Casa de swing, o grupo considerou que os adeptos a essa prática sexual são indivíduos que vão contra a corrente e surpreendem o discurso social de moralidade e monogamia com a troca de casais. O princípio do hedonismo é predominante, e os swingueiros revolucionam os paradigmas sociais. Assim como o canário, os freqüentadores da Casa são determinados pelo meio e por pessoas que se relacionaram em algum ponto de suas vidas, o que fez eliminar suas antigas visões monogâmicas. A opção pelo swing só é feita após consentimento mútuo do casal, isto é, não se configura como um simples impulso. Fazer swing não é "natural" culturalmente falando, apesar de ser uma atitude que segue as pulsões sexuais inerentes a cada ser humano. Ler o texto de Machado de Assis nos fez voltar o olhar para a bagagem cultural, o histórico, o repertório dos indivíduos analisados. A compreensão seria mais facilmente alcançada se considerássemos as motivações dos swingueiros. Traçamos perfis de pessoas com tendência a essa prática ao delinearmos personalidades e histórias de vida que proporcionaram "cabeças abertas".

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"Erva do diabo", de Carlos Castañeda, esclarece uma habilidade essencial para um estudo antropológico: a capacidade de adentrar universos estranhos.

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