Escravidão em Cuba
Por: YdecRupolo • 24/12/2017 • 2.663 Palavras (11 Páginas) • 356 Visualizações
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feita principalmente por comerciantes ingleses: depois da primeira guerra do ópio (1839-42), a Grã-Bretanha ganhou o monopólio de cinco portos chineses; mercadores de escravos logo perceberam que um deles tinha acesso fácil à província de Guangdong, onde milhões de camponeses pobres puderam ser convencidos a emigrar, sob falsos contratos, para terras distantes na esperança de encontrar um bom trabalho (Helly apud YUN e LAREMONT, 2001).
Dessa forma, cerca de 142 mil chineses foram levados a Cuba entre 1840 e 1875 (idem). Ao chegarem, estes trabalhadores foram submetidos a condições análogas à escravidão. Tinham, no entanto, um status legal diferente dos escravos negros com os quais conviviam (SCOTT, A Emancipação Escrava em Cuba, 1991, p. cap. 2); essas diferenças foram solapadas pela atuação dos dois grupos como soldados contra a Espanha, do lado rebelde – o fato de terem sido enganados levou muitos chineses a se juntarem aos revoltosos (idem).
De qualquer forma, a presença de soldados libertos “se tornou um elemento potencialmente causador de ruptura para a sociedade estabelecida” (idem, p. 74): armado, autônomo, um indivíduo nesta condição dificilmente voltaria a ser mão de obra cativa para uma fazenda.
A Lei Moret: Como a Espanha venceu a guerra e cedeu algo aos abolicionistas
A Espanha, que nunca chegou a perder o controle sobre o lado ocidental de Cuba, viu-se num paradoxo diante da Guerra dos Dez Anos. Se não abolisse a escravidão em Cuba, cederia fatalmente terreno aos abolicionistas e aos Estados Unidos, seus aliados. No entanto, se abolisse a escravidão, a opinião ortodoxa na Espanha era de quê as rendas vindas da ilha caribenha cairiam dramaticamente (SCOTT, 1991, Cap. 3).
A administração colonial tentou, assim, baixar um decreto que fosse intermediário: a Lei Moret. A partir de sua implementação, todas as crianças nascidas de uma escrava, assim como todos os escravos com mais de 60 anos seriam declarados livres. Além disso, estabelecia um conjunto de restrições a punições que definia como cruéis (idem, ibidem). A ideia era que a escravidão se exaurisse gradativamente, mas o fato foi que a lei não agradou nem a gregos e nem a baianos: abolicionistas a consideraram por demais branda, e fazendeiros passaram a repetidamente fraudar os recenseamentos, indicando que escravos idosos eram muito mais novos, e crianças tinham nascido antes da lei.
Portanto a ascensão à liberdade, de forma geral, continuou a ser como ser como era antes: escravos só conseguiam atingi-la se conseguissem fundos suficientes para comprá-la.
De qualquer forma, de 1862 a 1877, a população de escravos em Cuba declinou rapidamente; segundo Rebecca Scott (1991, cap. 4), a diminuição chegou a quase 50%. Os motivos para tal fenômeno são vários – entre eles, a proibição do tráfico e a entrada dos trabalhadores chineses.
Scott mostra, no entanto, que a queda no número de cativos de origem africana não tem a ver com uma crise inerente ao uso de escravos nas plantations: de fato, a redução se deu basicamente nas áreas mais urbainzadas da ilha, como Havana, onde a diminuição foi de quase 50%. Províncias como a de Pinar del Río, Matanzas e Santa Clara, cujas economias estavam fortemente ancoradas ao açúcar, o número de cativos aumentou em 62% no mesmo período.
As fazendas cubanas foram um núcleo de oposição à abolição. Não é raro que se atribua o uso de escravos ao uso de técnicas rudimentares de plantio; este não era o caso em Cuba, onde novas máquinas conviveram com um sistema escravista até a extinção da escravidão. (idem, cap. 2).
É claro que as fazendas tiveram de lidar com a nova conjuntura mundial. Com a extinção do tráfico, senhores passaram a tratar melhor de seus escravos e estimular sua reprodução. Além disso, os latifúndios começaram a empregar trabalhadores em regimes díspares, desde escravos nascidos na África até trabalhadoes livres e assalariados, passando por trabalhadores chineses sob contrato e libertos que recebiam um salário mas não poderiam sair da propriedade.
Para Rebecca Scott (idem, cap. 4), a presença de todos esses regimes de trabalho dentro das fazendas não eram sintomas do fim da escravidão, mas sim da elasticidade que seus principais defensores puderam imprimir a ela. Afinal, todas essas formas de trabalho foram implementadas sem que houvesse abolição.
Sendo assim, nas regiões produtoras de açúcar a maior parte das ações que visavam a abolição partiu dos próprios escravos, sob as formas de auto-resgate e fugas. De qualquer forma, a noção de que a escravidão terminaria sozinha (ainda que lentamente), graças à Lei Moret e às restrições ao comércio fez com que a abolição deixasse de ser um tabu.
Em 1873, a escravidão é abolida em Porto Rico. Em Cuba, escravos negros e trabalhadores chineses estão cada vez mais ativos, desafiando seus senhores, fugindo e formando comunidades autônomas (idem, cap. V). Em 1874, um golpe de Estado em Madrid pôs fim à primeira república, e reinstituiu a monarquia, na figura do rei Afonso XII. Para Scott (idem, ibidem), a turbulência na metrópole reduziu o campo de ação de ativistas pela abolição.
De qualquer forma, em 1878, a insurgência no leste da ilha é derrotada, e a Espanha volta a ter controle sobre todo o território. Uma vez terminado o conflito, os escravos que lutaram de ambos os lados foram libertados; não fazê-lo seria extremamente arriscado, dadas as promessas que haviam sido feitas. A medida foi impopular em todos os campos: para os abolicionistas, era insuficiente, enquanto os fazendeiros sentiram que seus direitos de propriedade foram desrespeitados.
A vitória da Espanha e a concessão de certa autonomia a Cuba não foram suficientes, no entanto, para acalmar os ânimos: havia ainda pesados impostos sobre os cubanos; artesãos estavam desempregados em grandes números; e, principalmente, os escravos sentiam-se traídos por não terem sido libertados após o fim da rebelião (idem, ibidem). Não demorou muito, portanto, até que outra estourasse: em 1879 começou a guerra chiquita, assim conhecida porque não durou mais de um ano, sufocada por uma repressão desproporcional. As insatisfações persistiram, dormentes somente até a independência final, que viria só em 1898.
Uma nova tentativa de resolver a questão foi o estabelecimento do Reglamento del Patronato, em 1880. Este conjunto de regulamentações da mão de obra escrava tinha como espírito o gradualismo, tido na época como virtude máxima (SCOTT, 1991, cap. VI). Definia que todos os escravos passariam a ser patrocinados e os senhores, seus patronos. Isso quereria dizer que os castigos físicos seriam proibidos, e os senhores
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