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Bacon e o método experimental

Por:   •  4/4/2018  •  2.107 Palavras (9 Páginas)  •  319 Visualizações

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A matéria prima para a ciência contemplativa de Aristóteles era obtida mediante a contemplação da natureza. A matéria prima para a filosofia ativa de Bacon só podia ser obtida mediante o exame da ação humana sobre a natureza. A lógica aristotélica ajudava a pensar; sua meta era a consequência lógica. A lógica de Bacon era um guia para a ação; sua pedra de toque estava em se funcionava ou não.

Esta ruptura com a tradição filosófica implicava uma mudança de atitude com relação a grandes perguntas que, durante dois mil anos, permaneceram às portas da filosofia europeia. É possível conhecer a verdade? Podemos julgar os objetos exteriores por meio dos sentidos? Até que ponto podemos confiar neles? Os metafísicos dão diferentes respostas a estas perguntas. (...) Nessa matéria, Bacon estava ao lado do homem prático, ainda que não tivesse adotado esta posição sem que antes houvesse refletido sobre o assunto. Pensava que era um erro começar pela questão da validade do nosso conhecimento. Porque esta questão era, talvez, por onde deveríamos terminar. A questão básica, para ele, residia na prova e na demonstração prática: “...esta questão de se o conhecimento é possível ou não, deve ser resolvida não na argumentação, mas sim provando-a”.

O método baconiano contém duas partes distintas: uma “destrutiva” e a outra “construtiva”. A primeira trata de purificar o entendimento humano dos obstáculos que o bloqueiam no acesso à verdade: é a crítica aos ídolos ou falsas noções. A segunda, compõe-se do método experimental e das tabelas de investigação. Ao apresentar sua história da ciência, Bacon apontava já para o fato de que toda história mostra que a ciência é o resultado da intervenção humana sobre a natureza e não simplesmente sua mera observação. Enquanto os homens limitam-se a recolher os frutos que a natureza lhes brindava, não podiam ter mais que um conhecimento elementar de botânica. Porém, quando o homem passou à agricultura e à horticultura, quando produziu e encarregou-se das sementes e das árvores frutífera, quando as projetou, propagou e aperfeiçoou, alcançou um novo estágio de conhecimento botânico. Do mesmo modo, a mineralogia e a química para o homem, que funde os metais e fábrica o vidro, encontra-se, em um nível elevado que a dos homens que só aprendem no polimento de pedras e sua escolha. Não se cria ciência somente pela via do pensamento, mas sim pensando naquilo que se põe de manifesto (na natureza) atuando.

Passando em revista os conhecimentos “frutíferos” do passado, Bacon expõe seu objetivo: “Engendrar e introduzir nova natureza ou novas naturezas em um corpo dado, tal é a obra e a meta do poder humano. Descobrir a forma de uma natureza dada, ou a sua verdadeira diferença específica ou natureza - geradora de natureza, ou fonte de emanação -, é a função do conhecimento humano”.

O que queria dizer Bacon com “engendrar e introduzir uma nova natureza num corpo dado”? Queria dizer algo bastante prático. Por exemplo, dentre seus escritos, vamos encontrar um projeto de ligar metais para uma grande variedade de propósitos: um projeto para fazer cristal mais claro, cristal colorido, cristal inquebrável, cristal resistente ao calor, etc.

Tudo isso são exemplos de “introdução” de uma nova natureza num corpo dado.

O que queria dizer com formas, ou verdadeira diferença específica? “Um homem que conhece as formas (leis) poderá descobrir e produzir efeitos que nunca foram produzidos antes, efeitos que nem as mudanças e os acasos da natureza nem a experiência da indústria realizaram ainda; efeitos que, de outro modo, jamais haveriam sido concebidos pela razão humana”.

In Lukács:

...o fato de Bacon privilegiar a prática não significa, de modo algum, um repúdio à razão; uma coisa não exclui a outra; ao contrário, estão intimamente vinculadas; uma prática verdadeira implica iluminação também verdadeira da razão. O que Bacon discute é que a razão deve estar livre dos juízos falsos e de preconceitos que limitem a apreensão da verdade.

Em Bacon encontramos a descrição e a fundamentação mais ampla e universal dos novos métodos desantropomorfizadores. Para estimar corretamente sua figura e sua importância neste processo de tomada de consciência, como reflexo aproximadamente adequado da realidade, pelo que interessa à nossa análise, há que se romper, antes de tudo, com uma falsidade histórica, veiculada antes de Hegel e filosoficamente “aprofundada” por este, a saber: a tese de que Bacon é um puro empirista, pai espiritual do empirismo posterior. Está claro que no centro da filosofia de Bacon encontra-se a prática, a transformação do mundo mediante o conhecimento adequado. Porém, essa finalidade não é em si mesma idêntica a do empirismo; não está de saída no pensamento de Bacon.

Bacon não frisou com tanta firmeza, com Galileu, Descartes ou Spinoza, a importância metodológica da matemática e da geometria; mas, combateu, em contrapartida, energicamente o esquematismo mental procedente das tradições do aristotelismo escolástico, e postulou apaixonadamente a construção de um aparato de investigações e de conceituações desantropomorfizadoras, determinadas pelo próprio objeto, e não pela pessoa humana. Esta resolução se deve, sobretudo, a que Bacon é, entre os grandes contemporâneos interessados por esses mesmos problemas, aquele que mais claramente viu a conexão dialética do correto conhecimento objetivo com a prática produtiva, com o domínio real da natureza.

Com isto, Bacon, combate todas as unilateralidades e a rigidez metafísicas do pensamento cotidiano e requer outras formas de consideração, que tenham entendimentos penetrantes e receptivos, de uma só vez. O verdadeiro tema de sua polêmica se dirige ao problema das mediações. Bacon crítica a filosofia – sobretudo Pitágoras, Platão e sua escola – porque “introduziu formas abstratas, fins últimos e causas primeiras, passando por cima das intermediárias”. Aqui se dá, também, uma luta em duas frente: contra a abstração e contra a imediatez, porque estas se encontram, precisamente, na ignorância ou no descuido das mediações e apelam para as reações espontâneas da pessoa humana à realidade, descuidando da necessária dedicação ao mundo das mediações ocultas, opostas, certamente, à aparência imediata.

O objetivo do verdadeiro experimento no método baconiano é romper com a vinculação imediata entre teoria e prática própria da vida cotidiana; superar seu caráter imediato com a descoberta e a inserção de um maior número

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