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Pessoas Portadoras de Necessidades Especiais e o Direito

Por:   •  13/4/2018  •  5.474 Palavras (22 Páginas)  •  409 Visualizações

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esses dois requisitos, tem-se o crime, cuja estrutura é bipartida.

Porém, a tendência da doutrina atual é enquadrar a culpabilidade como o terceiro elemento estrutural do crime, defendendo a divisão tripartida da teoria analítica, afirmando que delito é toda ação típica, antijurídica e culpável.

Doutrinadores, por sua vez, não consideram a culpabilidade como parte integrante do delito, uma vez que os artigos 1º e 23 Código Penal e respectivos incisos dispõem que sem tipicidade e ilicitude não há crime, ao passo que o artigo 26, caput, por sua vez, quando trata de causa excludente de culpabilidade, estabelece as hipóteses em que o agente deverá ser isento de pena, sem desconsiderar a existência do crime.

Nesta mesma esteira, compactua-se com o entendimento que considera a culpabilidade como elemento do crime, uma vez que representa o aspecto subjetivo do ilícito, isto é, a vontade de delinquir ou o entendimento do indivíduo acerca de prática criminosa e a capacidade de determinar-se nesse sentido.

Com isso, sem o livre-arbítrio de agir criminosamente e sem a potencial consciência da ilicitude, o juízo de reprovação que deveria recair sobre o autor do fato delituoso, deixa de existir. Em razão disso, não faz sentido considerar criminosa a conduta de um agente inimputável, se esta não é passível de reprovação ou censura.

Portanto no Código Penal, o tipo incriminador é formado pela descrição da conduta, seguida da referente pena, o que leva à conclusão de que crime é tudo aquilo que a sociedade deseja ver punido com pena, e não, com sanção diversa. Se crime é fato típico e ilícito, merecedor de punição pelo Estado, a culpabilidade é o fundamento legal pelo qual o jus puniendi deverá agir. Contudo, desconsiderar a culpabilidade como elemento do crime é ignorar o agente humano que pratica a conduta, e não há delito sem reprovação ou censura social.

Em 06 de janeiro de 2016, a Lei nº 13.146 de 06 de julho de 2015, entrou em vigor, no ordenamento jurídico brasileiro a qual institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). O Estatuto reúne uma série de direitos e garantias, desde educação, saúde e lazer ao atendimento prioritário em diversas circunstâncias.

Diga-se, de pronto, que não se questiona a necessidade de resguardar e de proteger pessoas que, por quaisquer circunstâncias, sejam mais sensíveis ou vulneráveis, como ocorre com idosos, crianças e portadores de deficiências.

O que se questiona, tão somente, é a recursiva estratégia de usar normas penais como soluções para todos os problemas, gerando, não raro, superposição de tipos penais, conflitos de normas absolutamente evitáveis. Rememora-se, sempre, que a legitimidade da intervenção penal não se resume à importância do bem que se pretende resguardar.

A Lei nº 13.146/2015 tem como objetivo, nos termos do seu art. 1º, assegurar e promover “em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.”, tendo como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque no ano de 2007 e integrados ao nosso ordenamento em condições equivalentes às emendas constitucionais.

A nova lei instituiu um elenco de direito às pessoas com deficiência. Por outro lado, obviamente, consagra deveres a serem cumpridos pelo Poder Público e por Particulares.

Nestes novos crimes, os sujeitos passivos apenas poderão ser as pessoas abarcadas pelo Estatuto. Trata-se, mais uma vez, de estratégia usual do legislador: criam-se novas proteções e, automaticamente, criam-se novos crimes, como uma forma de proteger toda a sorte de bens, não necessariamente jurídicos.

Nesse sentido, em seu Título II, a referida lei versa acerca “Dos Crimes e das Infrações Administrativas”, prevendo, ao longo dos dispositivos subsequentes, quatro novos tipos penais incriminadores.

Segundo Hélio Morselli, verifica-se, porém, que das supostas inovações jurídicas trazidas na nova legislação, há figuras meramente simbólicas, o que representa uma pseudofunção do direito penal. Com efeito, as condutas típicas descritas que antes não eram crimes são: “praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência”(art. 88) e “abandonar pessoa com deficiência em hospitais, casas de saúde, entidades de abrigamento ou congêneres”(art. 90).

Contudo, caso a pessoa portadora de deficiência, se enquadrasse no conceito de incapaz, tal abandono já estava consagrado pelo ordenamento, ao teor do artigo 133 do Código Penal (abandono de incapaz). Portanto, a nova lei, ao criar tipo penal próprio, consagra o abandono de pessoa deficiente, independentemente de esta ser ou não incapaz.

Já os artigos 89 e 91 apresentam condutas já previstas como crimes no Código Penal, como furto (art. 155 do CP), apropriação indébita (art. 168 do CP) ou até mesmo estelionato (art. 171 do CP), sendo que este último teria, inclusive, pena superior à estabelecida na nova lei.

Assim, a conduta descrita como a utilização “de cartão magnético, qualquer meio eletrônico ou documento de pessoa com deficiências destinadas ao recebimento de benefícios, proventos, pensões ou remuneração ou à realização de operações financeiras, com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem” (art. 91 da Lei nº 13.146/2015), poderia caracterizar o crime de estelionato (art. 171 do Código Penal), diante da obtenção de uma vantagem ilícita, induzindo ou mantendo alguém em erro, através de qualquer meio fraudulento.

Importante atentar ao fato que, para o crime de estelionato, o Código Penal prevê a pena de reclusão de um a cinco anos, enquanto que o delito previsto no Estatuto da Pessoa com Deficiência tem como pena reclusão de seis meses a dois anos. Assim, na ânsia de se punir mais, protegeu-se menos.

Observa-se, assim, mais uma atuação de punição do legislativo, o qual, muitas vezes, vê, exclusivamente, neste ramo do ordenamento jurídico a solução para todos os males sociais, perfazendo-se da suposta função simbólica do direito penal para utilizá-lo em qualquer oportunidade e de maneira acrítica. Haja vista, uma vez que outros ramos do direito possuem o condão de melhor tutelar os necessários direitos dos deficientes e hipossuficientes.

Em suma existe uma ideia de que determinado direito só estará protegido caso a sua violação fosse enquadrada como crime, o que, no entanto, pode ser falsa. Isso porque, quando algo é uma resposta para tudo, ele passa a não ser efetivo para nada. No Direito Penal começa a ser

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