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Eclesiologia Trinitária

Por:   •  2/4/2018  •  8.872 Palavras (36 Páginas)  •  327 Visualizações

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Por fim procura-se fazer apontamentos em direção a uma Igreja mais comunitária, que reflita a estrutura funcional proposta no Novo Testamento e na própria dinâmica trinitária.

1 HIERARQUIZAÇÃO DA IGREJA

De acordo com Snyder, “os protestantes evangélicos dão pouquíssima atenção à doutrina da igreja”.[4] Esta constatação se dá pelo fato de não haver um profundo pensamento eclesiológico na maioria das reflexões sobre evangelização, discipulado e ação social. Como conseqüência, não se questiona o conceito de Igreja como instituição hierárquica, onde é possível perceber divisão de autoridade e poder entre clero e laicato, sendo o primeiro superior ao segundo.[5]

Partindo do Novo Testamento, não se pode admitir a Igreja como instituição hierárquica. Os textos neotestamentários apontam para uma Igreja estruturada de forma orgânica, funcional. Ali havia um povo, uma assembléia reunida pelo próprio Deus para adorá-lo e testemunhar sua grandeza (Ef 1.5-6).

Esta assembléia logo haveria de se estabelecer como uma instituição hierárquica, uma organização onde se percebe diferenciação de ordem e poder entre aqueles que a compõe, os clérigos e os leigos. Entende-se por Clérigo àquele que se dedica à vida religiosa e faz parte do grupo que está no topo da pirâmide hierárquica da Igreja, ou seja, aqueles que compõem a liderança, que são ordenados, e em alguns casos remunerados. Já o leigo é aquele está abaixo deste grupo, isto é, aquele que não faz parte da liderança, não é ordenado e remunerado.[6] Ainda em relação ao clero, Mulholland acrescenta:

O clero não representa apenas uma questão de posição, salário, título, ou status na comunidade. É uma mentalidade que apóia o sentimento de que os pastores têm a responsabilidade de providenciar a visão para as igrejas e dirigi-las. Este pensamento produz a crença popular de que o clero é indispensável e responsável pelas igrejas.[7]

No capítulo a seguir, primeiro se deixará claro o significado do termo Igreja, haja vista as diferentes interpretações possíveis a esta palavra. Posteriormente, buscar-se-á demonstrar o processo de hierarquização da Igreja através de uma análise do episcopado, que passou de funcional para hierárquico. Também se verificará os termos utilizados nas Escrituras e empregados pela Igreja no decorrer da história para descrever os clérigos e leigos.

1.1 Definição do termo Igreja

Antes de tecer quaisquer considerações em relação à Igreja e seu processo de hierarquização, é preciso deixar claro qual é o significado deste termo, pois este tem assumido diferentes conotações de acordo com o contexto em que é inserido.

A palavra Igreja é a tradução do termo grego ekklesia, que na antiguidade significava a assembléia popular dos cidadãos efetivos e competentes da cidade. Esta sempre se referia à assembléia da polis, onde se tomavam as decisões de cunho político e judicial.[8] Já na Septuaginta, ekklesia é exclusivamente utilizada na tradução da expressão hebraica qahal, podendo referir-se a uma convocação tanto para consultas políticas quanto para reuniões religiosas.[9]

Embora esteja praticamente ausente dos evangelhos – com exceção de Mt 16.18; 18.17 – a palavra ekklesia foi empregada sistematicamente em Atos, nas cartas de Paulo e no Apocalipse. Pode-se dizer que no Novo Testamento ekklesia aponta para o ajuntamento, para a assembléia de um povo que tinha em seu centro a fé em Jesus Cristo.[10] Trata-se da “assembléia do povo de Deus”.[11] Portanto, o termo Igreja é sinônimo da expressão “povo de Deus”.

1.2 A Igreja primitiva e sua estrutura

Num primeiro momento, a comunidade cristã era vista como uma seita do judaísmo. Gradualmente foi se desvinculando deste e alcançando uma identidade própria, sendo reconhecida como uma igreja distinta da comunidade judaica.[12]

Na Igreja primitiva não se encontra uma elaboração eclesiológica, isto é, uma doutrina acerca da igreja.[13] Antes de uma definição, o que se percebe nos escritos neotestamentários em relação à comunidade primitiva é o emprego de uma ampla variedade de metáforas e imagens a fim de descrevê-la, como por exemplo: família (Gl 6.10; Ef 2.19; 1Tm 5.1-2), noiva (2Co 11.2; Ef 5.32; Jo 3.29), oliveira (Rm 11.17-24), lavoura (1Co 3.9), edifício (Ef 2.20-22; 1Co 3.9), sacerdotes (1Pe 2.5), casa de Deus (Hb 3.3-6), corpo de Cristo (Ef 4.12; 1Co 12.12-26). A igreja era vista como um povo chamado a participar da koinonia do Espírito.[14]

Não se deve concluir a partir daí que a comunidade primitiva era desestruturada. Na realidade havia certa estrutura, mas longe de ser formal, institucionalmente hierárquica. Pode-se até conceber a igreja nascente como uma instituição uma vez que sociologicamente “qualquer padrão de comportamento coletivo que se torna habitual ou costumeiro já é uma instituição”.[15] Contudo, deve-se ressaltar que ela pode ser considerada como instituição em sentido amplo, e não num sentido estrito, de uma organização rígida, hierárquica.

Não se percebe na comunidade primitiva a coexistência de dois povos como na igreja hodierna, a saber: o clero que oferece o ministério e o leigo que o recebe.[16] Emil Brunner nota que a comunidade neotestamentária, em sua estrutura, “não conhece distinção entre ativo [clero] e passivo [leigo], entre aquele que administra e aqueles que são recipientes”.[17] Tratava-se de uma comunidade estruturalmente funcional, carismática, uma comunhão livre de crentes.[18] Mas esta realidade mudou na medida em que a igreja cresceu e avançou na história.

1.3 A hierarquização da Igreja

À medida que se desenvolveram doutrinas acerca da Igreja, desenvolveu-se também a sua hierarquia. Esta hierarquização se deu de forma gradativa. Como assinalado acima, ao se verificar a centralização de poder na figura do Bispo, e o emprego de certas palavras para designar o povo e a liderança dentro da igreja no decorrer dos séculos, se perceberá este processo de hierarquização. A igreja – assembléia do povo de Deus, comunhão livre de crentes – transformou-se numa instituição hierárquica. Acabou passando de uma comunidade de pessoas com lideranças reconhecidas pelo povo, para uma instituição hierárquica com lideranças estabelecidas pelo clero. A diaconia – serviço – passou a ser ofício.[19]

1.3.1 Hierarquização do episcopado

Nota-se que Bispo, no Novo Testamento,

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