CRIANÇAS SOLDADOS
Por: Hugo.bassi • 7/3/2018 • 10.411 Palavras (42 Páginas) • 292 Visualizações
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As novas guerras, como são chamadas por Munkler, são marcadas por conflitos regionais decorrentes de diferentes circunstâncias, não somente questões econômicas ou territoriais, como eram antigamente, mas também se incluem nos casos de conflitos assimétricos questões como guerrilhas e terrorismo. Essas guerras acontecem em pequenos territórios, nos quais os inimigos não buscam o combate direto e decisivo, porque não possuem força total para este combate ou porque não são os modelos de conflito desses atores. Nas novas guerras não é possível identificar um início significativo e nem um final preciso, sendo um exemplo o caso dos enfrentamentos entre palestinos e israelenses na Intifada. Crianças e adolescentes jogam pedras contra soldados fortemente armados, e suas únicas proteções foram as câmeras da imprensa internacional que mostram ao mundo as desigualdades da luta.
O modelo das guerras clássicas aparenta estar em desuso, segundo Munkler, podemos observar a crescente atuação dos atores privados nos conflitos[d], sendo eles os senhores da guerra, empresários e mercenários, que tornam presentes a comercialização da violência de guerra, definidos pela falta de distinção do uso da força e da atividade econômica. Essas mudanças estão ligadas às diferentes etnias, grupos radicais e religiosos ligados à mesma ideologia dos financiadores (KALDOR, 2001). Independente do contexto da guerra, podemos perceber que todos têm em comum as motivações, sendo elas compromisso político e vinculações patrióticas, interesses econômicos junto com o gosto pela aventura e motivos ideológicos, que normalmente são mais relacionados a motivos religiosos, e sobretudo para se dedicarem à criminalidade e à oportunidade de controle do Estado e dos benefícios do reconhecimento internacional.
Conforme Munkler, a maioria dessas novas guerras se desenvolve sobre o princípio de guerrilhas, cuja principal característica é a ausência de uma batalha decisiva entre os inimigos. Os atores das novas guerras utilizam uma defesa estratégica para manter a existência das mesmas, sem buscar uma solução militar definitiva para o fim do conflito. Entendem que para enfraquecer o inimigo, precisam exercer uma busca de armamento maior que a dele, ou realizando ataques breves e rápidos contra seu oponente, no qual podem atingir civis e pessoas que não estão envolvidas na guerra. Desta forma, por não haver um combate direto e uma destruição e perdas significativas para ambos os lados em um mesmo momento, a guerra se prolonga e se fortalece com investimentos internos e externos, sem previsão de término. Por um período sem ataques, pode-se pensar que o conflito chegou ao fim, porém, ocorre um retorno da violência, denominado “low intensity wars”.
As novas guerras são marcadas por processos de paz, entretanto, os pequenos grupos que propagam seus pensamentos através da violência impedem o processo. Teoricamente neste momento o poder de Estadistas e de órgãos executivos deve ser praticado, impondo as leis e tornando obrigatório o cumprimento destas, mas podemos notar que o poder do Estado e um grande exército armado é pouco para acabar com esses conflitos. Os Estadistas pretendem conseguir que todos os grupos capazes de utilizar da violência para obter seus interesses renunciem desta ação, podendo assim substituir os tratados de paz das guerras clássicas pelos processos de paz das novas guerras, convencendo esses grupos que a harmonia é a melhor opção.
São características das novas guerras uma administração descentralizada e fragmentada, alto nível de importações, além de investimentos de empresas e Estados do cenário internacional que obtém lucros com os conflitos, vendas de armamentos, compras de produtos ilegais, tráfico de pessoas, etc. A maior parte do sustento do conflito também é através de saques a campos de refugiados, abastecidos por organizações internacionais que trabalham para cessar o conflito e ajudar os não armados. Como descreve Munkler, os grupos armados utilizam do medo para obrigar os indivíduos não armados a contribuírem com o conflito ou não reagirem aos ataques realizados por eles, usando da violência e do medo para obter o controle sobre a sociedade que se encontra alheia à situação, impedindo-os de escolher um lado. Além disso, executam punições para os que não aceitam. O autor cita que as novas guerras são marcadas pelo uso da violência como prêmio, e é cada vez mais comum mutilar o corpo de vítimas e utilizar pedaços como troféus.
A questão econômica é importante, porém não é o único motivo das novas guerras e nem das guerras clássicas. A ideologia é um motivo relevante para os conflitos atuais, são utilizadas como ferramentas pelos atores paraestatais envolvidos para atrair o apoio da sociedade ao conflito e justificarem suas ações violentas, sendo uma forma de legitimar o uso da força bélica praticada por esses grupos. Questões étnicas, religiosas e questões sociais são utilizadas como instrumentos para que esses grupos possam recrutar mais apoio na sociedade e aquisição de soldados, pois nas novas guerras não há uma força armada dos Estados que participavam nos combates, os soldados são cidadãos recrutados na sociedade civil que se unem aos grupos por acreditar nos mesmos interesses, terem a mesma religião e mesmos ideais.
No que tange as velhas guerras, os motivos pelos quais estes confrontos acontecem são pautados pelas necessidades dos países em buscar uma ascensão no cenário internacional, buscar poder de barganha e força para discussões em blocos multilaterais. Esses podem não ser os motivos pelos quais as guerras atuais acontecem, em sua maioria são questões econômicas, mas questões de identidade de etnias, radicais e religiosos podem agravar e prolongar esses conflitos. A economia pode ser o principal motivo dos conflitos atuais devido a diferença entre os países, que pode ser notada no cenário internacional atual. As diferenças econômicas no sistema internacional, em um cenário que não possibilita o desenvolvimento de economias emergentes e periféricas, acabam criando altas taxas de pobreza, desemprego, desigualdade, etc. (MUNKLER,2005)
O autor argumenta que a Guerra dos Trinta Anos tem muitos aspectos das novas guerras, o que demonstra que esses conflitos atuais não são inovadores, são apenas um retorno de um modelo de conflito antigo. O exemplo usado pelo autor são as guerras da China e Vietnã, Iraque e Irã, nos quais pode-se observar que há uma ligação de valores e interesses dos atores estatais, principais senhores de guerras, paraestatais e privados.
Munkler cita que esses novos conflitos podem desencadear três novos processos, a desestatização
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