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Regresso

Por:   •  17/4/2018  •  2.339 Palavras (10 Páginas)  •  269 Visualizações

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No Brasil, no começo do século XX, um professor de São Paulo, escreveu um livro que foi amplamente divulgado, chamado “Interpretação e Aplicação do Direito”, esse professor era Carlos Maximiliano. Esse livro foi a base de sustentação a partir da qual se concebia o estudo da hermenêutica como método. Ele dizia que interpretar é ser capaz de percorrer os caminhos de acordo com determinada proposta. Então, nós vamos encontrar em Manuais de Direito de Direito Civil, Direito Processual Civil, Direito Penal, um capítulo sobre interpretação. Esse capítulo sobre interpretação vai dizer quais são as técnicas de interpretação, a interpretação teleológica, que vai verificar a finalidade da norma, a interpretação histórica, que vai tentar resgatar o que disse o autor.

Nós consideramos que essa perspectiva foi relevante e ela foi a dimensão dominante da interpretação do Direito até meados do século XX, porque a partir de meados do século XX, principalmente a partir da década de 60, nós temos um contexto de superação dessa dimensão metodológica da interpretação.

A primeira influência para essa superação é a chamada Filosofia da Linguagem. A Filosofia da Linguagem ficou conhecida como um movimento de autores austríacos, que começaram a propor o fato de que o mundo era constituído pela linguagem. Debatendo com filósofos da consciência esses pensadores começaram a anunciar que nós nos enganamos quando dizemos que a ciência do século XIX pretendeu conferir uma objetividade das coisas, a ciência pretendia dominar os elementos da natureza e submeter todos esses elementos ao crivo do racionalismo.

Esses pensadores austríacos vão dizer que o problema são esses elementos, e a conclusão sobre eles é linguagem. Não existe outra coisa senão a centralidade da linguagem, na forma pela qual eu percebo todas as coisas e na forma pela qual eu existo.

Nesse cenário dos anos 60 também foram publicadas duas obras muito importantes para o que a gente vai chamar de giro hermenêutico em direção à linguagem, ou essa virada em prol da linguagem. Primeiro a obra “O Conceito de Direito” de Hart (pensador inglês) publicada em 1961 e a obra “Verdade e Método” de Gadamer, publicada em 1960.

Esses dois livros inseriram o debate contemporâneo sobre o Direito no plano da linguagem e da interpretação. Esses dois livros começaram a apontar uma superação da interpretação que era concebida como método, projetando a interpretação em termos da linguagem de uma crítica ao método e uma crítica ao historicismo.

A gente poderia trabalhar o pensamento de Gadamer em três perspectivas: a questão da Centralidade da Linguagem, a Crítica ao Método e Crítica ao Historicismo.

O que diz respeito à Centralidade da Linguagem Gadamer foi um leitor e foi amplamente influenciado por Heidegger. Heidegger é um autor do final do século XIX, que nos primeiros 15 anos do século XX efetivamente propôs uma alteração da percepção do mundo. No livro chamado “Ser e Tempo” Heidegger entra na discussão sobre a historicidade, sobre a existência do sujeito e valendo-se disso Gadamer vai afirmar que o ser que se interpreta é a linguagem. A primeira consideração relevante empenhada por Gadamer é dizer que a nossa existência se confunde com a linguagem.

Os filósofos da consciência entendiam que a nossa existência se resume ao conhecimento formulado sobre o mundo ou a projeção que nós fazemos sobre o mundo. Gadamer vai, de certa forma, evoluir nessa consideração e dizer que não só a minha existência é linguagem, como o mundo é uma linguagem sobre as coisas. O que existe de fato não é a objetividade pretendida pela ciência, o que existe de fato é uma linguagem.

Gadamer vai dizer que a dicotomia sujeito-objeto, que foi talvez a síntese do debate filosófico do século XIX, não entendeu que o médium ou o fio condutor (expressão de Gadamer) de toda compreensão e de toda interpretação é a linguagem.

Gadamer exemplifica isso com a arte: qual é a correta interpretação de uma obra de arte? Então, se eu tenho uma obra de arte aqui no quadro, qual a melhor maneira pela qual eu a interpreto? As correntes que defendiam uma perspectiva subjetiva, diriam que só é possível interpretar a obra se souber quem foi o sujeito que a elaborou, se eu puder mergulhar no horizonte de vida desse sujeito, saber quem ele foi, o que ele pensava, como ele foi criado, quais eram as convicções religiosas, políticas e sociais, e assim eu vou conseguir compreender essa obra. A vertente objetivista (realismo) vai dizer que não importa quem é o autor, eu preciso valorizar a dimensão estética e o que objetivamente/efetivamente aquela obra representa, é preciso anular o sujeito.

Gadamer vai dizer que a conciliação da interpretação se faz na linguagem. E a linguagem é o caráter presente da interpretação. E aí a gente percebe que a presentificação da interpretação para Gadamer seria mais ou menos dizer o seguinte: eu leio o artigo do Código Civil que afirma que o absolutamente capaz é o maior de 18 anos. Uma interpretação no âmbito da doutrina tradicional diz que eu preciso pensar o que pretendeu o legislador quando afirmou que a capacidade absoluta se adquire após os 18 anos, a vertente objetivista nos diria para esquecer a vontade do legislador, devemos pensar o que de fato é capacidade e o que de fato a capacidade significa ser atingida após os 18 anos.

Gadamer vai dizer que a relevância disso não está em anular o sujeito ou o objeto, a relevância disso está na linguagem, que se torna presente quando o ser interpreta ou quando o ser lê aquele artigo e postula as suas convicções, e as suas convicções são produtos de concepções prévias, que Gadamer vai chamar de pré-conceitos.

A estrutura dos pré-conceitos e a ideia que Gadamer propõe para o chamado círculo hermenêutico vão nos dizer efetivamente que nós somos sujeitos de convicções prévias. Nisso observamos uma influência de Heidegger, porque pré-conceito é a ideia de que a nossa compreensão do mundo é produto que se confunde com a nossa existência no mundo. O Heidegger tinha uma expressão para isso, traduzida como ser-no-mundo. O fato de que a maneira pela qual eu enxergo o regulamento jurídico da capacidade no Código Civil não pode subtrair a minha estrutura de pré-conceitos, a minha estrutura prévia de concepções de mundo, que são produto do fato de que eu existo em uma realidade histórica.

O problema é que a crítica ao historicismo é feita exatamente nessa ideia do pré-conceito. Paul Fry dá um exemplo sobre isso: um autor que diz “o Criador ergueu o seu braço de plástico”.

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